quinta-feira, 20 de setembro de 2012

Data

Um papel sem data não vale nada ...

Jovem escriturário numa grande (à época) casa agrícola da região oeste, marquei no cartório notarial a escritura de venda de uma pequena courela que, sendo da casa, se encontrava encravada entre dois talhos que lhe não pertenciam, não tendo qualquer hipótese de exploração com um mínimo de rentabilidade.

No dia aprazado para o "solene" acto e de acordo com as indicações que tinha, deixei um recado, em papel grande e com letra de imprensa, na mesa que a isso estava destinada. Dizia mais ou menos o seguinte:

"Senhor F..., agradeço que esteja no cartório notarial às 12H00, para assinar a escritura da Lameira. Obrigado. O"

Fui à minha vida, verificar se estava tudo em condições e tratar de alguma imponderável de última hora que surgisse.

A pontualidade era uma norma da casa, cumprida escrupulosamente por toda a gente, do empregado mais humilde ao patrão, que detestava atrasos e ficava de "cabelos em pé" quando alguém se atrasava, incluindo ele próprio. Estranhou-se, por isso, que às 12H00, o outorgante mais importante não estivesse ainda presente.

Cinco, dez, quinze minutos e nada! O notário já desesperava e o ajudante do dito via a sua hora de almoço comprometida.

Os telemóveis ainda nem em projecto existiam e o telefone do cartório não era para uso público.

Embaraçado e sem saber o que fazer, pedi ao notário para, violando a regra, me deixar telefonar para a quinta. 

O último dos cinco números mal tinha acabado de regressar à posição inicial do disco e a voz surgia do outro lado:

- Sim!?
- Senhor F..., estamos todos à sua espera ...
- De mim, para quê?
- Para a escritura da Lameira, respondi, percebendo que qualquer coisa não tinha corrido bem.
- Deixei um papel escrito, em cima da mesa da sala ...
- Vi e li. Não tinha data, não adivinhava que era para hoje. Vou já para aí!

Passaram mais de quarenta anos. Ainda hoje, em qualquer situação, coloco sempre, mas sempre, a data. Para não ter surpresas ...

Sem comentários: