quarta-feira, 30 de junho de 2021

Contrato

Até no andar não se fazia notado, apesar de sempre apressado. Mal punha os pés no chão, e mesmo por cima das folhas, o seu caminhar era discreto. Só os mais atentos descortinavam a sua aproximação e nem sempre isso acontecia. Ficava visivelmente satisfeito quando chegava sem ninguém dar por ele.

Era um caçador exímio, senhor de uma pontaria invulgar e conhecia todos os sítios que "cheiravam" a caça, locais de perdizes ou narcejas, galinholas, codornizes ou coelhos. Lebres não, que era espécie que por ali não aparecia. Mesmo trôpego, mantinha a suavidade do andar e o gosto de atirar, no fim já só aos coelhos, que as espécies de penas exigiam mobilidade que já não tinha. Esperava, pacientemente, que o bicho saísse da lura, deixava-o correr alguns metros, disparava um tiro e ... coelho na sacola.

A voz era sussurada e ligeiramente sibilada. Era necessária muita atenção do interlocutor para se perceber o que queria transmitir, mas ninguém se atrevia a pedir-lhe para falar mais alto. Era tempo perdido. Aquele era o seu tom e dele nunca abdicou, quer se dirigisse às gentes mais simples quer à fidalguia.

Contava-se que, quando pediu à noiva que com ele casasse, lhe terá dito:

- Só tem uma condição: não quero que, lá na nossa futura casa, alguém fale mais alto do que eu ...

O contrato foi aceite e permaneceu válido a vida inteira. Naquele lar, nunca ninguém levantou a voz e todos se entendiam sem dificuldade.

terça-feira, 29 de junho de 2021

Vento

Numa manhã de vento, como é costume e já não se estranha, havia poucos pescadores e menos veraneantes. Talvez durante a tarde, uns e outros aumentem, mas não pertenço à "fauna" da tarde. Na ida à aberta, quando o pescador se lamentou do assoreamento da Lagoa que afasta o peixe, por falta de alimento, lembrei-me de Manuel Alegre. Era presença assídua na pescaria e, muitas vezes, a nadar nas águas frias e revoltas que deliciam os que gostam da Foz. Já não aparece. Os anos não perdoam ...

Lembrei-me, também, que Maria Bethânia fez 75 anos em 18 de Junho e que gravou Senhora das Tempestades, belíssimo poema de um excelente livro com o mesmo nome, todo ele dedicado à Foz do Arelho.

segunda-feira, 28 de junho de 2021

Liberdade

O Carlinhos, talvez açoitado pelo vento do Oeste, passou por aqui, numa visita muito rápida, apenas com o intuito de não ser esquecido e por lhe parecer que, de vez em quando, é importante fazer ouvir a sua voz desassombrada e livre.

- Tenho andado a correr mundo, sempre de máscara, claro, a tentar perceber quantos milhões de pessoas ainda não tiveram acesso à vacina Covid. Ninguém sabe ao certo e muito poucos pensam nisso. Desde que haja para mim ... quero lá saber!

Nem me deixou opinar.

- E estou muito preocupado com o teu país, que considero meu e pelo qual nutro muita simpatia e apreço.

E porquê, consegui perguntar.

- Soube, por uma televisão internacional, que há por cá pelo menos uma Câmara que forneceu os dados pessoais dos organizadores de manifestações, às entidades contra quem elas eram dirigidas, incluindo embaixadas de países onde a liberdade não habita ou vive muito mal. Nem quis acreditar, mas confirmei logo depois num outro noticiário.

Pois, parece que sim, disse eu sem grande convicção.

- E vocês não fazem nada? Não protestam, não exigem responsabilidades, encolhem-se?

Está a decorrer um rigoroso inquérito, retorqui.

- Vou-me embora. Tenho mais que fazer. Mas deixa-me que te diga que me desgosta ver o país de Abril tolerar atitudes destas.

Nem me deu tempo de esboçar uma "cotovelada". Correu, desenfreado, gritando à despedida:

- Tem cuidado. Chega sempre alguém que se aproveita e, quando derem por isso, já está instalado. O último durou quase meio século.

domingo, 27 de junho de 2021

Euro 2020

 

Portugal - 0 / Bélgica - 1

No futebol, como na vida, nem sempre ganha quem é melhor.

sábado, 26 de junho de 2021

Livros (lidos ou em vias disso)

(...) - E quem devo anunciar? - Arqueou a sobrancelha esquerda, para olhar de cima aquele despojo endomingado.

   - Mestre Perramon ... Diga-lhe que fui ajudante do maestro da capela da Catedral. E da igreja del Pi ... 

Enquanto falava, ia pensando que mais vale ser cão de casa rica que herdeiro de casa pobre. O lacaio, que também pensava o mesmo, abandonou-o no amplo vestíbulo iluminado pelas janelas que davam para a rua Ample. A vista engasgava-se-lhe com tantas cadeiras, consolas, cornucópias, candeeiros, bibelôs, estatuetas, relógios, cortinas, penas de pavão real, bengaleiros, jarrões de Manises e de cristal de Murano, tapeçarias, quadros cujas molduras eram maiores do que a própria pintura, janelas, escadas, parapeitos de mármore branco com balaústres dourados, bustos de imperadores romanos, do rei Carlos, o outro, o do próprio marquês quando era jovem, esperto, inteligente, simpático e um pouco menos rico, cadeirões forrados com um listado muito elegante e aparente, azulejos que reproduziam arabescos infinitamente complicados, escrivaninhas inúteis com gavetas fechadas, uma armadura solitária e misteriosa, relógios de parede, relógios de mesa, relógios de bolso ... Nunca tinha visto tantas coisas numa só divisão. Sentiu uma tontura ao pensar que aquilo era só o vestíbulo. Então ocorreu-lhe que, talvez, vá-se lá saber porquê, teria sido mais razoável ter batido à porta de serviço. Mas já não havia remédio. Torceu o tricórnio entre as mãos nervosas. Porque é que demorava tanto?

    - Faça o favor de me seguir.

Não se tinha dado conta de que estava diante do lacaio de sobrancelha arrebitada. Mas, pelos vistos, tinha-lhe desaparecido a expressão de desprezo e agora fazia cara de pau. Isto é, o marquês vai  receber-
-me (...)

Sua Senhoria
Jaume Cabré

sexta-feira, 25 de junho de 2021

Verão

Com atraso, mas chegou!

Finalmente, o Verão arribou à Foz e ofereceu uma manhã de sonho. Sem vento, céu azul e um mar, verde, lindíssimo. A água estava igual a sempre, naturalmente fria, como convém para refrescar as ideias e (re)lembrar que estamos no Oeste e não no Algarve ou nas Caraíbas.

Notava-se o efeito da nova máquina que garante a limpeza do areal e que os trabalhos para a dragagem da Lagoa prosseguem em bom ritmo. Vamos ver o que trará de novo e se resolverá, de forma clara, o problema que, há tantos anos, assola a Lagoa. Não convém esquecer que o mar trabalha sem descanso, sem projectos nem adjudicações e altera completamente a orla de um dia para o outro.

Soube bem! Venham mais dias assim, mas poucos, para não enjoar. Pelas previsões, amanhã volta o "capacete".

quinta-feira, 24 de junho de 2021

Netos

A festa ainda não pôde ser aberta, sem máscaras nem constrangimentos e, para cúmulo, o pai só esteve presente graças às novas tecnologias, e por pouco tempo, que o trabalho em terras húngaras é exigente e o tempo urge.

O meu neto Duarte faz hoje NOVE anos e, precisando bem, parece que nasceu "ontem". Está um homenzinho, a marcar a sua presença, os seus gostos, a sua vontade, a sua personalidade, o seu futuro que, claro, se deseja risonho e feliz.

E é tão bom vê-los crescer e sentir que, em cada dia que passa, há mais um "tijolo" na construção da sua vida.

Parabéns DUDU, meu querido neto!

quarta-feira, 23 de junho de 2021

EURO 2020

 


PORTUGAL - 2 / França - 2

E agora os oitavos, para tentarmos ganhar à Bélgica!

terça-feira, 22 de junho de 2021

Lógica

Não tem idade, pátria ou morada conhecidas. Nem sequer tem pais e muito menos se conhece a região de onde surgiu. É conhecido em todo o mundo, variando o nome em função da língua que é falada.

Por cá é o Carlinhos. Percebe de tudo, tem opinião fundamentada sobre todas as matérias, domina perfeitamente todos os problemas e tem sempre as soluções na ponta da língua. Poderia, facilmente, ser comentador televisivo e seria disputado a peso de ouro, elevando as audiências a níveis estratosféricos.

Em tempos idos e numa das suas primeiras intervenções, demonstrou a inexistência de lógica, sem recorrer a quaisquer fórmulas matemáticas e utilizando apenas o saber empírico, de tal forma claro que toda a gente entendeu, incluindo a professora que lhe colocou a questão.

- Carlinhos, o que acha da lógica?

- Nada. Eu acho que não há lógica, senhora professora.

- O menino não está bem, Concentre-se, pense, deixe-se de parvoíces e responda.

- Mas eu posso demonstrar, senhora professora. Quando venho para a escola e quando regresso, toco nas campainhas de todos os prédios. Lógico seria que me chamassem o "toca campainhas".

- Claro!

- Não, senhora professora. Gritam "lá vem o malandreco do quinto andar".

A professora nunca mais falou sobre lógica, nem se deve ter esquecido da demonstração.

O Carlinhos manteve a sua pertinácia até aos dias de hoje e há-de voltar com outras, das muitas demonstrações de sapiência que guarda no seu "cofre-forte".

segunda-feira, 21 de junho de 2021

Verão

Se consultarem o calendário, verão que chegou o Verão; se ouvirem as rádios, virem as televisões e lerem os jornais, verão que chegou o Verão. Verão ainda que hoje, por força do solstício, é o maior dia do ano. 

Se forem à Foz do Arelho verão que o Verão não veio. Terá perdido o comboio? É possível. Se forem à estação, verão que, mesmo no Verão, os comboios são cada vez mais raros e demorados. E, se olharem bem, verão que, mesmo conseguindo um comboio que chegasse às Caldas, o Verão ainda tinha de apanhar um autocarro o que, verão, não é tarefa fácil nesta cidade nem tem nada a ver com o que se passa noutras. Verão, ainda, que o autocarro suportado pela Autarquia para transportar os admiradores do Verão, apenas funciona diariamente no mês de Agosto. Se consultarem o horário, verão que inicia os seus trajectos apenas às 11 horas, porque antes, como verão, nem vale a pena descer ao mar.

Mas voltando à Foz, se lá forem verão que o vento se mantém e verão, também, as bandeiras vermelhas desfraldadas (são 3), numa clara manifestação de gozo pelo que o Benfica (não) fez esta época. Verão ainda que a praia está mais limpa graças à nova máquina adquirida pela Autarquia, que irá trabalhar, a máquina, claro, durante todo o Verão, mesmo que ele não chegue, por estar assim determinado numa lei já bastante antiga, aceite por todos, sempre com a esperança de que o calendário se cumpra.

E verão meia dúzia de pescadores desportivos, a lançarem o isco para o mar revolto. E verão ainda um casal de velhos que, teimosamente, foram à procura do Verão e, talvez por dificuldades naturais da visão, não o encontraram.

Sejam resilientes, como agora se diz a propósito de tudo e de nada. De Verão ou de Inverno, vão sempre à Foz. Verão que vale sempre a pena e, algumas vezes, verão o Sol aparecer por entre o nevoeiro e verão, se levarem um termómetro, que a água, por vezes, quase atinge os 16 graus.

Não haja qualquer dúvida que a Foz vale sempre a pena. Não retenham do que ficou dito qualquer desistência. Nem pensar!

Se lá forem amanhã, verão que é Verão também na Foz.

Hoje era segunda-feira ...

domingo, 20 de junho de 2021

RESCALDO

Rescaldo - s.m. 1. calor reflectido de uma fornalha ou de um incêndio 2. cinza que contém brasa 3. acto de deitar água nas cinzas de um incêndio 4. cinzas lançadas por vulcão 5. aparelho para conservar quentes as comidas servidas à mesa 6. camada de estrume que se coloca em torno de um caixão com plantas para aquecer a terra pela fermentação 7. resultado de alguma coisa; saldo.

in Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa

Procurando bem e com alguma elasticidade, talvez se aplique a definição contida no número 7. e, mesmo assim, ficam algumas dúvidas. Assim sendo, o melhor é não fazer o rescaldo do que se passou ontem na capital alemã da cerveja e aguardar que as terras húngaras de Buda não tenham Peste e ajudem a recuperar o fôlego e a ambição de voltarmos a ir longe.

Na quarta-feira há mais, mas é e continuará a ser apenas um jogo de futebol, com três resultados possíveis, sendo o empate o mais provável, por ser com ele que tudo começa.

E nem o tempo ajuda! Um mergulho na Foz por dia, nem sabe o bem que lhe fazia!

sexta-feira, 18 de junho de 2021

EURO 2020


Decorre até ao próximo dia 11 de Julho o Campeonato Europeu de Futebol que, neste ano especial, também contém, ele próprio, algumas especificidades. Desde logo, realizar-se em ano ímpar, mantendo a designação Euro 2020, por a pandemia ter impedido a sua concretização no ano que lhe estava destinado. Não me recordo de alguma vez isto ter acontecido, mas o malfadado coronavírus tem transtornado tudo, até o futebol.

A minha memória, que já não é grande coisa se é que alguma vez foi, também não alcança qualquer outro Europeu que tivesse lugar em tantos países. São onze ao todo - Alemanha, Azerbaijão, Dinamarca, Escócia, Espanha, Hungria, Inglaterra, Irlanda, Roménia e Rússia - e que os jogos privilegiassem uns países em detrimento de outros. De facto, na fase de grupos, Alemanha, Dinamarca, Espanha, Holanda e Inglaterra, disputam os três jogos nos respectivos países, apoiados pelos seus adeptos e sem necessidade de deslocações. Há ainda três outros - Escócia, Hungria e Rússia - que também jogam em "casa", embora apenas por duas vezes. Os restantes  quinze, entre os quais Portugal, jogam fora do seu país e, ainda por cima, disputam dois jogos numa cidade e o outro num outro país.

Claro que a pandemia é a responsável por tudo isto e a UEFA garante que a competição será disputada em perfeitas condições de igualdade para todas as equipas, uma vez que, sem qualquer excepção, todos iniciarão os jogos com onze jogadores.

Assim, não há quaisquer dúvidas sobre as condições iguais para todas e, se porventura elas surgirem, o VAR estará a postos para tudo esclarecer.

quinta-feira, 17 de junho de 2021

Conversas e siglas

As conversas são como as cerejas, lembro-me sempre e bem. Nos tempos de escola e nos delas, aproveitávamos um qualquer furo para dar uma fugida à praça, ali a não mais de duzentos metros, e, descendo, tirávamos uma de cada banca, sob o olhar risonho e cúmplice das vendedeiras. Vinham sempre três ou quatro e, no final, quase enchiam o bolso.

Neste fim-de-semana, uma conversa de circunstância a propósito de pacotes de açúcar, relembrou variadíssimas coisas do "antigamente" que, para os mais jovens, terão proximidade à "idade da pedra".

- E os pacotes da SEMPA, lembram-se? E o que queria dizer SEMPA?

- Salazar Envia Militares para Angola. E, ao contrário, Angola Precisa de Militares Enviados por Salazar. 

- E ainda falta um ... Só Esta Mxxxx Para Adoçar.

Risada geral, perante a brejeirice do dito e a ignorância do mesmo por muitos.

Lembrei-me de muitas outras siglas cujo significado era alterado, à boca pequena. Havia expressões que os ouvidos sensíveis não toleravam.

PVT significava, oficialmente, Polícia de Viação e Trânsito, mas o meu pai ensinou-me, muito novo, que também podia ser Provadores de Vinho Tinto. Talvez fosse mais adequado e ele conhecia muitos ...

FNPT era a sigla de Federação Nacional dos Produtores de Trigo, instituição governamental que centralizava o armazenamento do cereal produzido para, depois, o vender aos que o moíam. As más línguas diziam que seria melhor chamar-lhe Fome No País Todo.

Quando se estranhava alguém "ao alto", a pergunta surgia:

- O que faz aquele?

- Trabalha na SAPEC.

A SAPEC era uma grande empresa de minas, adubos e outros produtos para a agricultura. A resposta informava os curiosos que aquele "braço de trabalho" executava a função não nela mas sim na Sociedade Anónima de Polidores de Esquinas e Calçadas ou, circunscrevendo à região, na Sociedade Anónima de Polidores de Esquinas das Caldas.

Há muitas mais, mas hoje ficamos por aqui, não vá aparecer alguém a querer saber o que significava GNR. 

quarta-feira, 16 de junho de 2021

Condução de risco

Um fim de tarde outonal, regado por uma violenta chuvada que apanhou toda a gente de surpresa. A estrada, larga, de paralelo granítico hoje em dia já raro, não convidava a velocidades e muito menos a travadelas bruscas. As primeiras chuvas após o Verão são sempre traiçoeiras e oferecem dissabores quando menos se espera. Todo o cuidado é pouco e uma distracção pode ser a "morte do artista".

Os recrutas saíam em magote do quartel, ávidos do aproveitamento de um pouco de sol discreto que havia surgido e da vida "civil" que a cidade oferecia. Era a rotina diária, quando não havia instrução nocturna. Um passeio antes do recolher, comer qualquer coisa diferente do rancho, ouvir outras vozes, conhecer a terra e apreciar as beldades.

A condutora deve ter ficado perturbada com tantos e tão garbosos jovens. O travão, as mãos ou o destino levaram a viatura a galgar o passeio e a colher sete militares. Poderiam ter sido setenta. Por sorte, foram apenas sete e nenhum em estado grave. Veio o Oficial-Dia, o Sargento da Guarda, o Comandante da Instrução e, claro, a PSP, para além da ambulância, que recolheu os feridos para a enfermaria.

Ninguém tinha dúvidas de que a culpa era da incúria da senhora. A tropa levantou o auto, a polícia instruiu o processo. Passados vários meses, o Tribunal marcou a audiência. Meia dúzia de testemunhas atestaram a normal excelência da condução da senhora, o Delegado pediu que fosse feita justiça, o causídico da defesa levantou-se e desenvolveu a sua tese em busca da absolvição da ré. A sua eloquência mostrou, à saciedade e à sociedade que o acidente apenas tinha acontecido exactamente por "acidente acidental" e nunca por inépcia da condutora. Talvez alguma deficiência técnica da viatura, algum obstáculo na estrada, qualquer coisa de imprevisível que não foi possível descortinar naquele momento. Todavia, de uma coisa não havia dúvidas: tinha sido a destreza e o sangue-frio da condutora a evitar uma tragédia. Aquele magote de instruendos, saídos do quartel sem os cuidados necessários e num tropel inconcebível, teria sido dizimado não fosse a perícia da mulher que estava ao volante. 

A absolvição pedida foi sancionada pelo Juiz, por não ter sido possível provar, em julgamento, negligência, insensatez ou culpabilidade. Na leitura da sentença, o Juiz não se esqueceu de recomendar à senhora que, ao passar pelo quartel, se não distraísse com a paisagem.

terça-feira, 15 de junho de 2021

EURO 2020

PORTUGAL - 3 / Hungria - 0

Com sofrimento, mas o primeiro já cá canta. E as fontes da nossa utopia enchem-se de esperança.

segunda-feira, 14 de junho de 2021

Sebastião

Preto, pêlo lustroso, cauda a abanar, olhos atentos ao que vai acontecendo à sua volta. Anda e ciranda, chamando a atenção e reivindicando as honras da casa. Quatro patas, orelhas meio caídas, nem o chamamento da dona, acompanhado de petisco visível, o afasta das visitas.

- Este cão ... está com medo da trovoada.

E não era para desprezar. Os relâmpagos iluminavam o céu e sucediam-se a um ritmo frenético. O Sebastião, encolhido, procurava o apoio das nossas pernas e dizia, lá na sua língua:

- Deixem-me ficar aqui. Não faço mal a ninguém, lá fora chove muito e eu tenho medo da luz.

Os clientes do hotel manifestaram agrado e carinho pela presença do animal, e a gerente ficou menos constrangida e não o pressionou mais.

- Adora estar cá dentro e quando vêm clientes novos, fica curioso e não arreda pé. Por vezes, afasta-se e pode estar três ou quatro horas sem aparecer. Mas volta sempre ...

Certo dia, um habitante fazia a sua caminhada e o Sebastião, preocupado, por certo, com a sua segurança, seguiu-o a alguma distância. Percorridos três ou quatro quilómetros, o homem chegou a casa e só então reparou que o cão o tinha acompanhado até ali. Conhecia-o bem e sabia onde morava. Já não lhe apetecia caminhar mais e resolveu pegar no carro, oferecendo um lugar ao Sebastião e trazendo-o de volta ao hotel. Aí chegado, abriu a porta do carro e o Sebastião, agradecido, saiu. Já estava nos seus terrenos e ficou por ali, a desfrutar mais um pouco de ar puro, sem pressa da hora de recolher. Alguém, de passagem, presenciou a cena e concluiu, de imediato, tratar-se de abandono de animal. Daí a telefonar para a GNR, comunicando o "crime" e a matrícula do carro do "insensível" ser humano foi um instante, talvez até usando o telemóvel ao volante. 

As autoridades vieram de imediato e encontraram o Sebastião ainda na rua. Confirmava-se o "crime" denunciado e era urgente contactar o "criminoso". A matrícula transmitida permitiu chegar-lhe depressa e ouvir a surpresa do homem, contando o que tinha acontecido.

Satisfeito com a duração do recreio e da actividade física, o Sebastião aproveitou a nesga da porta e instalou-se no "quarto" que lhe pertence e de onde esteve prestes a ser arredado, por uma denúncia anónima, apressada ... mas politicamente correcta.

domingo, 13 de junho de 2021

Livros (lidos ou em vias disso)

(...) Manhãs, dias, tardes, noites, madrugadas, dias, semanas, meses, anos. O Língua e o padrinho iam e vinham. Um ensinava, outro aprendia. O que havia para ser dito era dito, o que não, observando bem, também estava dito à sua maneira. Não só o padrinho e a madrinha, mas toda a gente entendeu que o menino era reservado, firme, de poucos lamentos e de poucas respostas. Ele assumiu a sua condição de escravo com uma altivez inédita na plantação. Se cá veio para, assim inteiro e tão menino, é porque quis. Isto pensava toda a gente. E esse quis não era vontade, era coragem. De modo que todas as perguntas foram dadas por respondidas e o mistério passou a fazer parte do grande património das coisas que os escravos nunca disseram, nunca dizem e nunca dirão.

Manhãs que passaram

Cada criatura tem a sua hora do dia e da noite. Mesmo com a Lua e com o Sol isso acontece. Também há peixes que dormem de dia e há plantas que acordam de madrugada. Há pássaros que cantam com o sol e há arco-íris de estrelas. A hora das crianças é a do nascer do dia. Sentem um sono pesado e uma ansiedade de se levantar que não sabem o que fazer. Era nessa hora que havia mais trabalho para os escravos. O Língua rezava com o padrinho e a madrinha e ficava à espera da primeira conversa da manhã. (...)

Biografia do Língua
Mário Lúcio Sousa
D.Quixote (2015)

sexta-feira, 11 de junho de 2021

Tolices da língua

A sede do concelho ficava a cerca de légua e meia do lugar onde morava. Os caminhos para lá chegar não eram nada agradáveis de percorrer, íngremes, cheios de socalcos, com pedra solta e barro com fartura, consumiam sempre duas horas bem medidas, a andar bem, claro. Só lá se deslocava para pagar a décima da casa e das duas courelas que lhe tinham cabido em herança, ou para qualquer outro assunto oficial a que não conseguisse escapar. À cautela, fazia os possíveis por não ter problemas com as autoridades, fechando-se no seu casulo e nas terras que lhe garantiam o pão.

Agora não podia adiar mais. A filha tinha nascido em Janeiro e já íamos Março dentro. Meteu-se ao caminho, com uma saca de serapilheira dentro do saco que levava a tiracolo. A saca de capuz era essencial para prevenir o Março, marçagão. 

Ainda não eram nove horas quando chegou junto à porta, fechada, do Registo Civil. Esperou, descansando da caminhada e aproveitando o sol que brilhava com intensidade. Talvez chovesse de tarde, para contrariar o ditado, mas a manhã estava linda. Um senhor assomou à porta, camisinha branca, gravatinha preta, colete com corrente de relógio e os manguitos de seda, também pretos, que davam distinção e prestígio à função.

- O que quer?, ouviu sem sequer ser antecedido de um bom dia, como sempre acontecia lá no lugar. Paciência, pensou, as pessoas importantes não perdem tempo com ninharias ...

- Venho dar a minha filha ao "registro" ...

- Quando nasceu?

- Faz hoje dois meses.

- Já devia ter vindo. Agora tem de pagar cem escudos de multa.

A cara de espanto deve ter comovido o funcionário.

- Há uma forma de não pagar a multa. Declara que a rapariga nasceu a 13 de Fevereiro e fica resolvido.

- 'tá bem. Se pode ser assim ...

- Como se chama a mãe?

- Maria da Visitação.

- E o pai?

- "Jaquim" Piedade.

- E a miúda?

- Sei lá ... olhe, "prante-lhe" Ana, que é o nome da avó. 

Pagou o que lhe foi pedido, com gorjeta, e recebeu a ordem para voltar daí a quinze dias, a recolher a cédula.

Os anos passaram. A miúda fez-se mulher, com o suplício do registro sempre presente.

- Como se chama?

- Prantelhana da Visitação Piedade.

- Nome esquisito ... e quando nasceu?

- Parida a 13 de Janeiro, mas no papel consta 13 de Fevereiro de 1940.

quinta-feira, 10 de junho de 2021

Dia de Camões

José Mário Branco cantando um soneto de Camões, ao qual acrescentou um refrão para reforçar a ideia.

De manhã, aproveitando o feriado e porque já vamos com um terço de Junho cumprido, calcei os chinelos e fui até à Foz. O areal ainda se mantém com a sujidade do costume mas, lá ao fundo, na zona onde irão ser instaladas as barracas, uma máquina começa a endireitar a areia e a limpar as canas, os plásticos, as caixas de anzóis, as garrafas de cerveja, e muito outro lixo que continua a "nascer" na praia, seguramente de "geração espontânea".Passeio junto à Lagoa, a caminho do mar, aproveitando bem o ar puro que o vento transporta e sem ver o sol, que ainda dormita bem lá atrás das nuvens. Vem a onda, fraca, molha os pés, e ouve-se a voz do mar:

- Trouxeste o gin?

- Claro que não. Vinha dar um mergulho!

- Fizeste mal. Com este gelo que tenho dentro de mim, fazíamos um brinde ao Camões.

O melhor é continuar na areia, que o "frigorífico" está ligado no máximo ... 

P.S. - Soube-se hoje que a Câmara Municipal de Lisboa "bufou" a Moscovo os dados pessoais dos organizadores de uma manifestação levada a cabo no passado dia 23 de Janeiro. Apesar das desculpas públicas de Fernando Medina e da atribuição das culpas à burocracia, custa muito ouvir que, quase 50 anos depois de 1974, ainda haja no país quem ache normal "entalar" alguém em nome da BURROcracia.

quarta-feira, 9 de junho de 2021

Livros lidos e lembranças

Talvez alguém tenha reparado na rapariga que viveu na Rua do Loreto, na paragem do 28. Não dizia coisa com coisa. Ele, o combatente, estacionava carros ruas abaixo, na António Maria Cardoso. Ter-se-ão cruzado ou não, terão conversado ou não, foram contemporâneos como duas árvores, dois cães vadios, dois actores, são contemporâneos. Ele andava sempre de manga curta, nunca tinha frio. Ela vestia uma longa saia, camisolas negras e rasgadas. Tapava-se com caixotes. Dormia à chuva. Quem sabe se notavam que mudávamos de passeio para os evitar, mudar de passeio no qual ia a nossa morte e não a sua.(...)

Maremoto
Djaimilia Pereira de Almeida

Nunca vivi, felizmente, na paragem do 28 da Rua do Loreto, mas utilizei-a muitas, muitas vezes. Morava na Damasceno Monteiro e trabalhava no Largo do Calhariz. O 28 era o transporte que utilizava, por ser o mais barato e o que me punha no trabalho e em casa, sem transbordos nem grandes distâncias a pé. 

Logo pela manhã, subia até ao Largo da Graça, cumprimentando a vizinhança, tomava a bica na Parreirinha e aguardava a chegada do amarelo, que subia a Voz do Operário tilintando a avisar o perigo que representava a sua enorme velocidade. Mal parava, o guarda-freio mudava a alavanca da, até aí, frente, para a traseira, que passava, agora, a ser a frente, enquanto o "pica" alterava as meias-portas, fixando as ripas no lado contrário e libertando as do lado que, em seguida, seriam utilizadas. Depois, um deles rodava o letreiro enquanto o outro, cá fora, indicava quando os Prazeres substituíam a Graça no visor electrónico

Tudo gostoso, como diria, sorrindo, qualquer brasileiro. Ter prazeres e graça de seguida não é nada fácil, mas é salutar.

Os utilizadores normais, que tinham bilhete, entravam pela porta da frente e sairiam pela traseira, quando chegasse ao seu destino, fosse ele Prazeres ou qualquer outro. Usufruíam, nessas inolvidáveis viagens, de um transporte não poluente e beneficiavam do ar condicionado ao tempo que fazia cá fora, sem alterações que contribuíssem para alguma incómoda constipação ou gripe. A chuva entrava pelas meias-portas como "cão por vinha vindimada", molhando o piso, os bancos, a manga do casaco do guarda-freio e até o seu boné. O "pica" encolhia-se no corredor, sabendo que, lá mais abaixo, no final da Calçada de S. Vicente, teria de saltar e, com a ferramenta adequada, fazer a mudança da agulha. Ansiava que a chuva apanhasse outro eléctrico até este lá chegar!

Os penduras utilizavam os confortáveis lugares na parte de fora, lá atrás, nas portas fechadas, nos estribos, bem encostadinhos ao amarelo, não fosse a parede, distraída, roçar as suas costas e tirar-lhes a pintura. E saltavam em andamento, com uma agilidade que deixava o pica sempre a meio da frase

- Sai ... daí.

Já lá não estavam!

As coisas que a gente se lembra por associação de ideias.

terça-feira, 8 de junho de 2021

segunda-feira, 7 de junho de 2021

Palavras bonitas

                                    TOADA DO LADRÃO

A mim não roubaram                                           que a não trocaria
porque eu nada tinha.                                          por coisa nenhuma;
Mas roubaram tudo                                              que filhas assim
à minha vizinha.                                                   havia só uma.

Vejam os senhores:                                               Pois hoje um ladrão
Roubaram-lhe a ela                                              Que há muito a mirava
a filha mais grácil,                                                entrava-lhe em casa
a filha mais bela.                                                   p'ra sempre a levava.

Nem na sua casa,                                                  E a minha vizinha
nem na freguesia,                                                  dona de solares
sequer no concelho,                                              e de longas terras
melhor não havia.                                                 com rios e pomares,

Prendada, bonita ...                                              e de jóias raras
E, depois, uns modos                                            que ninguém mais tinha,
de matar a gente,                                                  ei-la num instante
de prender a todos.                                               pobrinha... pobrinha...

Dizia a vizinha                                                      (Tem pomares ainda,
que era o seu tesoiro;                                           tem jóias, tem oiro ...
que valia mais                                                      Mas de que lhe servem
que a prata e que o oiro;                                      sem o seu tesoiro?)

                                     - Vizinha e senhora,
                                    não me queira mal!
                                    Se há ladrões felizes,
                                    sou o mais feliz
                                    que há em Portugal.
Campo Aberto
Sebastião da Gama
Edições Ática (1999) 

domingo, 6 de junho de 2021

Pinhal

Manso, como convém a quem se quer instalar sem perturbações nem constrangimentos, o pinheiro cresce arredondado, na companhia de outros iguais ou com diferenças muito ténues. Não dá nas vistas, é apenas mais um do conjunto que, ao longe, forma uma bonita e vistosa mancha verde, convidativa, repleta de sinais de unanimidade, guardada pelo moinho, vigilante, que lá do cimo tudo controla e mantém na linha.

Lá ao longe, do outro lado, o bravo que "em verde e oiro se agita" domina o horizonte, atento ao vento e ao que se passa em volta, balança, ondeia, barafusta, contraria, discorda, refila, contesta, grita, gesticula. Está isolado mas isso não o impede de sentir a injustiça do vento que o fustiga, do sol que o atinge em cheio, da ausência de chapéu que o proteja, da violência da chuva que o encharca do cocuruto às raízes. Mas resiste, resiste sempre, à espera que outros cresçam, o apanhem e acompanhem.

Um dia, quem sabe, talvez os mansos deixem de estar acomodados no sossego e os bravos se reproduzam e se tornem os suficientes para que o pinhal seja mais forte, do alto da sua razão.

sábado, 5 de junho de 2021

Livros

Ler é um acto que exercito, diariamente, há muitos, muitos anos. Poucas ou muitas, há sempre algumas páginas que preenchem o meu dia a dia e me desafiam. Também o vício de comprar me acompanha, não com a mesma regularidade, felizmente para a carteira. Ainda assim, já não conseguirei ler todos os livros que comigo habitam.

Há algum tempo - talvez um mês, por aí - participei num encontro via Meet, com pessoas das minhas relações mas não das que conhecem a casa e a frequentam. Era o tablet que servia de suporte à conversa e, a meio, surgiu no ecrã o aviso, vermelho, de que a bateria carecia de carregamento. No escritório, a única tomada livre estava longe e o carregador não lhe chegava.

Mudei de sala e, quando assentava novos arraiais, um dos participantes, mais perspicaz, atento ou curioso, comentou:

- Ena, pá, tantos livros. São verdadeiros? 

Não imaginava que pudesse haver falsos mas, pelos vistos, será hoje possível apresentar um móvel a fazer de conta, para encher o "olho" da câmara e dar um ar importante. Respondi que sim, eram verdadeiros, e apenas uma parte dos que existiam cá em casa. 

Apercebi-me dos sorrisos e arrependi-me de imediato. Há coisas que é preferível ignorar e não comentar. 

sexta-feira, 4 de junho de 2021

Jardim

De novo a rega automática montada, para garantir que a gota abastece as plantas e as fortalece, sem a presença ou intervenção humana.

No início não queria funcionar. À primeira vista, tudo parecia em condições, não se descortinando qualquer falha no equipamento ou na montagem. Todavia, o sistema queixava-se de qualquer coisa estranha, que o incomodava e o fazia negar-se a funcionar bem.

O material tem sempre razão ... o filtro estava sujo da inactividade e, como não conseguia lavar-se sozinho, pedia ajuda.

Lavou-se, limpou-se, montou-se ... já se pode ir passear, que a vida das plantas fica garantida, mesmo que o S. Pedro, por excepção, envie muito calor para o Oeste.

quinta-feira, 3 de junho de 2021

Lagoa

Há tubos, bóias, jangadas, operários, uma draga em pedaços, a ser montada como se de um Lego se tratasse, uma azáfama grande, mesmo em dia santo. O tempo urge e é inclemente.

A curiosidade sobre o sítio onde irão ser despejadas as areias dragadas é grande mas, por enquanto, o local permanece no "segredo dos deuses" ou inacessível ao cidadão mal informado sobre os corredores do poder.

Nos últimos anos, a dragagem da Lagoa tem sido recorrente mas o assoreamento continua sem fim à vista. Os técnicos, que sabem disto a sério, dizem que não há cura definitiva e que apenas se consegue mitigar os danos inexoráveis do tempo; os conhecedores da Lagoa afirmam, com o saber empírico da experiência e do conhecimento diário daquelas águas, que a solução passa pela abertura de um canal profundo, da Aberta até ao Braço da Barrosa, para que o efeito das marés atinja toda a extensão da Lagoa.

A ver vamos! Este ano, uma vez mais, haverá constrangimentos para os habituais "clientes" da praia da Lagoa. A mim, que sou "cliente" fiel da do Mar, não me deverá fazer diferença. Egoísta!!!

quarta-feira, 2 de junho de 2021

Tempo

" Nascemos únicos e morremos cópias"

Não me lembro se ouvi ou li, mas espero que o autor me perdoe a ousadia de utilizar sem referir a fonte e sem autorização. A idade já me dá direito a estes luxos, que não devem ser copiados e que merecem sempre reparo.

A manhã de hoje teve "conversa de velhos", a propósito dos pequenos títeres que a pandemia trouxe, permitindo que gente sem o mínimo de condições e com propensão para farsante, abra a boca e, como não entra mosca, deite cá para fora asneira da grossa.

- Aqui quem manda sou eu!

E vamo-nos calando, os velhos porque já lhes falta a paciência e sobra-lhes a dificuldade em serem ouvidos, e um bom punhado dos mais novos, porque sim. A opinião (ainda) é livre e o direito à asneira está a querer prevalecer em detrimento da busca do melhor caminho, da boa solução, do que interessa a todos. Grita-se muito, comenta-se muito, gosta-se muito e ... cala-se (já) muito.

Nascemos únicos ...

A pouco e pouco vamo-nos dobrando ao que não se deve dizer, que é feio, ao que não se pode fazer, que fica mal, à escolha da mesma rua, porque toda a gente a escolhe.

... e morremos cópias.

Assim, vamo-nos tornando presas fáceis de um qualquer "gritador", que não terá dificuldade em arranjar um modelo de chapéu para servir na maioria das cabeças.

... Sei que não vou por aí!

terça-feira, 1 de junho de 2021

Fia-te na virgem ...

Trinta dias tem Novembro,
Abril, Junho e Setembro.
De vinte e oito (ou 29) há só um
E o resto é de trinta e um!

A cantilena, aprendida muito cedo, ensina a forma de decorar a duração dos meses, evitando o desconforto de sermos surpreendidos pela ignorância ou traídos pelo esquecimento, como tantas vezes se vê por aí.

Junho chegou ao Oeste, cinzento, com o borriço do costume, para que não haja tentações de encher as praias e sujeitar-se ao risco de surgir um polícia, com a fita métrica, a tirar as dúvidas sobre a distância, ou a policiar o início do areal, que determina a zona de colocar a máscara no bolso.

Ao que dizem (sim, sou antigo mas não desse tempo), na década de 40 do século passado, havia brigadas de costumes que circulavam pelas praias medindo os fatos de banho, certificando que o seu tamanho não ultrapassava a moral vigente, bem guardada e reprimida.

Conto começar a época balnear assim que o S.Pedro resolva determinar que o Oeste também é merecedor de algum sol e calor (pouco). Não vale a pena pedir água quentinha ou mesmo morninha, que essa, já se sabe, está sempre ausente destas paragens e em férias pelos Algarves ou pelas Caraíbas.

Espero encontrar amigos, ler, conversar, andar, mergulhar, com os cuidados recomendados e sem necessidade da companhia de qualquer polícia, munido de fita métrica ou de outro qualquer instrumento persuasivo. Se não tiverem mais nada para fazer, dediquem-se à pesca! A Foz é um bom lugar!