Mostrar mensagens com a etiqueta José Saramago. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta José Saramago. Mostrar todas as mensagens

quarta-feira, 16 de novembro de 2022

Centenário

Se ainda por cá estivesse, o nosso Nobel da Literatura sopraria hoje 100 velas no bolo de aniversário. Talvez aproveitasse para fazer um discurso deixando alertas, recomendações, reprimendas, sugestões a todos nós, aproveitando para lamentar a forma como nos comportamos e como estamos a enterrar o futuro.

No ano passado, para assinalar esta mesma data, escolhi o texto que, sobre esta cidade, nos deixou na Viagem a Portugal. Lido agora, até parece que não passaram quase trinta anos.

Hoje fica registado um pedacinho da História do Cerco de Lisboa, para aguçar o apetite a alguém mais desatento ou distraído, que ainda não o conheça.

"(...) Agora sentado à secretária, com as provas do livro de poesia diante de si, segue atrás do pensamento, ainda que talvez fosse mais exacto dizer que o antecede, pois, sabendo nós como o pensamento é rápido, se nos contentamos com ir atrás dele em pouco tempo perdemos-lhe o rasto, ainda estamos a inventar a passarola e já ele chegou às estrelas. Raimundo Silva tenta, pensando e repensando, perceber por que desde as primeiras palavras não pôde reprimir a agressividade, Não sabe o que é o deleatur, incomoda-o sobretudo a lembrança do tom com que atirou a pergunta, provocador, mesmo grosseiro, e depois o duelo final, os inimigos, como se houvesse ali uma questão pessoal a dirimir, um rancor velho, quando se sabe que estes dois nunca se encontraram antes, e, se sim, não deram um pelo outro, Quem será ela, pensou então Raimundo Silva, ao pensá-lo afrouxou, sem dar por isso, a rédea com que vinha guiando o pensamento, foi quanto bastou para que ele lhe passasse à frente e começasse a pensar por conta própria, é uma mulher ainda nova, menos de quarenta anos, não tão alta como primeiro lhe parecera, o tom da pele mate, os cabelos soltos, castanhos, os olhos da mesma cor, um nada menos escuros, e a boca pequena e cheia, a boca pequena e cheia, a boca pequena, a boca, cheia, cheia. Raimundo Silva está a olhar a estante que tem em frente, encontram-se ali reunidos todos os livros que reviu ao longo duma vida de trabalho, não os contou mas fazem uma biblioteca, títulos, nomes, ele é o romance, ele é a poesia, ele é o teatro, ele são os oportunismos políticos e biográficos, ele são as memórias, títulos, uns célebres até aos dias de hoje, outros que tiveram a sua boa hora e para quem o relógio parou, alguns ainda suspensos do destino, Mas o destino que temos é o destino que somos, murmurou o revisor, respondendo ao que antes pensara, Somos o destino que temos.

História do Cerco de Lisboa
José Saramago
Caminho (1989)

terça-feira, 16 de novembro de 2021

Aniversário de Saramago

Se fosse vivo, José Saramago completaria hoje 99 anos. 

A sua Fundação iniciou hoje as comemorações do Centenário do nascimento do Prémio Nobel da Literatura de 1998, que se prolongarão até Novembro de 2022. 

Resolvi também comemorar e fui à estante. Peguei na Viagem a Portugal, edição de 1997, autografado pelo autor em 24.10.1998, e reli parte do que Saramago escreveu, com o brilhantismo que se lhe reconhece, sobre as Caldas da Rainha. Algumas observações bem pertinentes e até a referência ao "dono" da minha rua (Costa Mota), entre outros ceramistas de renome, lá se encontram.

"(...) De manhã, nas Caldas, vai-se ao mercado. O viajante foi, mas não fez compras. O mercado das Caldas é para avios domésticos, não tem mais pitoresco do que isso. Em grande engano caem os turistas que indo de passagem vêem o magote de vendedores e compradores, tão ao natural, e irrompem excitadíssimos, enristando máquinas fotográficas, à procura do ângulo raro e do raro espécime que lhe enriquecerá a colecção. Em geral, o turista fica frustrado. Para ver comprar e vender não precisava de vir tão longe.

Onde se está bem é no jardim. Ao mesmo tempo íntimo e desafogado, o jardim das Caldas da Rainha é, para usar o nariz-de-cera, um lugar aprazível. O viajante senta-se por aqueles bancos, divaga ao longo das áleas, vai vendo as estátuas, naturalistas por via de regra, mas algumas de boa factura, e depois entra no museu. Abunda a pintura, embora nem toda se salve: o Columbano, o Silva Porto, o Marques de Oliveira, por quem o viajante torna a confessar rendida estima, o Abel Manta, o António Soares, o Dórdio Gomes, e alguns outros. E também, claro está, o José Malhoa: afinal, este homem foi excelente retratista e bom pintor de ar livre e atmosfera. Veja-se o retrato de Laura Sauvinet, veja-se o Paul da Outra Banda. E se se preferir um documento terrível, sob as aparências brilhantes da luz e da cor, olhe-se As Promessas por todo o tempo necessário até que a verdade se mostre. Estas pagadoras de promessas que se arrastam no pó requeimado pelo Sol são um retrato cruel mas exacto de um povo que durante séculos sempre pagou promessas próprias e benesses alheias. A dúvida que assalta o viajante é se José Malhoa saberia o que ali pintava. Mas isso importa pouco: se a verdade sai inteira da boca das crianças que nela não pensam como oposto da mentira, também pode sair dos pincéis de um pintor que julgue estar só a pintar um quadro.

Também nas Caldas da Rainha se deverão ver as cerâmicas. O viajante confessa que tem um sério amor por estes barros, e tão aberto que precisa de vigiar-se para não cair em tolerâncias universais. Não se toma por entendido na matéria, mas é familiar da D. Maria dos Cacos, do Manuel Mafra, dos Alves Cunhas, dos Elias, do Bordalo Pinheiro, do Costa Mota Sobrinho, para não falar de anónimos fabricantes que não punham marca nas suas peças e tantas vezes as modelavam magníficas. Se o viajante começa a falar de louça das Caldas, há o risco de levar o dia todo: cale-se pois, e siga viagem. (...)"

Viagem a Portugal
José Saramago
Caminho (1997) 

terça-feira, 5 de maio de 2020

Dia Mundial da Língua Portuguesa

Meia dúzia de exemplos, curtos, dos muitos que se podiam dar, para ilustrar a beleza desta língua que é a nossa e falada por muitos milhões, em várias partes do globo, com características diferentes em cada sítio mas sem necessidade de acordo ortográfico para que nos entendamos todos.

(...) Andam por ali uns homens desgarrados, e embora a praça seja mais para a tarde, há quem se chegue ao feitor e pergunte, Que é que o patrão resolveu, e ele responde, Nem mais um tostão, que as boas e pertinentes fórmulas não se devem perder e dispensam variações, e os homens dizem, Mas há seareiros que já pagam trinta e três, e diz Pompeu, Isso é lá com eles, se quiserem ir à ruína, bom proveito lhes faça.(...)
José Saramago
Levantado do chão
Editorial Caminho

(...) - António, foi por minha causa, eu pago-te o cavalo ...
 - Não digas mais, Bernardo, não digas mais, que já nem te vejo todo. O cavalinho pateou ao meu serviço, a perca é minha. Deixa, se se arrastar até casa, bem sei o que lhe hei-de fazer.
Descansámos ali a noite e, com sopas de vinho e boa pitança, reanimámos o animal, a pontos de se aguentar em pé. E, embora moêssemos um dia até Trancoso, o cavalinho lá foi andando.
- Cão de mim - maluquei - se trago o macho não sofria o dano de vinte libras, que era quanto o Orlando dava pela bestinha no mercado dos quinze. O mulo engolia o estirão sem tocar com um casco no outro. Mas adiante, vamos a ver, talvez o Orlando lhe pegue ... (...)
Aquilino Ribeiro
O Malhadinhas
Bertrand Editora

(...) Estou apaixonada.
Que coisa boa, até que enfim; disse a amiga, que se chamava Paula.
Mas ele não está interessado em mim.
Isso é duro, querida, é a pior coisa do mundo. Eu sei por experiência própria. Lembra aquele rapaz que estava comigo na festa do sábado passado?
Loreta não lembrava, ela não via nenhum outro homem a não ser Luís.(...)
Rubem Fonseca
Secreções, excreções e desatinos
Campo das Letras

(...) Mas certo dia vi-a a entrar num beco e em vez de a chamar, como fazia habitualmente, fui andando atrás dela. E de madrugada fui bater-lhe à porta. Ela perguntou quem eu era, dei-lhe o primeiro nome que me veio à cabeça. Como me explicou depois, o nome coincidia com o de um fulano que costumava visitá-la a meio da noite e por isso abriu a porta sem temor. Ao ver quem era logo tentou de novo fechá-la, mas era tarde, eu já tinha meio pé metido dentro de casa.(...)
Germano Almeida
As memórias de um espírito
Editorial Caminho

(...) Nga Sessá e as amigas mudaram a doente e os lençóis muitas vezes, a infeliz parecia ia se derreter em suor e gemia, adormecia, acordava:
- Aiuê! Minha barriga, minhas costas! Morro!
Só sossegou mais meia-noite já, começou respirar mais calma, a gemer com voz baixa, calando aquelas conversas do homem que lhe amigou para adiantar roubar os bois, dos ladrões de bois, dos ladrões do dinheiro dela, um advogado de Malange e os filhos mulatos e tudo o resto que don'Ana, sá Domingas e o capitão gostam falar.(...)
José Luandino Vieira
Nosso musseque
Editorial Caminho

(...) Lhe conto uma história. Me contaram, é coisa antiga dos tempos de Vasco da Gama. Dizem que havia, nesse tempo, um velho preto que andava pelas praias a apanhar destroços de navios. Recolhia restos de naufrágios e os enterrava. Acontece que uma dessas tábuas que ele espetou no chão ganhou raízes e reviveu em árvore.
Pois, senhor inspector, eu sou essa árvore. Venho de uma tábua de outro mundo mas o meu chão é este, minhas raízes renasceram aqui. São estes pretos que todos os dias me semeiam.(...)
Mia Couto
A varanda do frangipani
Editorial Caminho


segunda-feira, 25 de setembro de 2017

Teatro

O Teatro Municipal Joaquim Benite, de Almada, vai levar à cena a História do Cerco de Lisboa, adaptando o romance homónimo que José Saramago escreveu em 1989. Conto lá ir, não logo na estreia - irá acontecer em 12 do próximo mês - mas, de acordo com a disponibilidade da agenda, talvez na semana seguinte.

Entretanto e porque já não (re)lia Saramago há uns tempos, fui à estante e, como sempre "gente fina é outra coisa": a forma de escrever, as voltas que o texto dá, os adágios, as opiniões, o humor, o "diz que disse", a descrição minuciosa, tudo evidencia o grande trabalho e o prazer de escrever, sendo certo que este não deve ser tão grande como o prazer de reler passados tantos anos.

E já agora, por falar em Teatro, o Teatro da Rainha estreia um novo trabalho a 5 de Outubro - Play House, de Martin Crimp. Lá estarei como de costume.

quarta-feira, 16 de novembro de 2016

Nobel da Literatura

Pôs-se a Caminho ...

Na Viagem a Portugal ter-se-á Levantado do Chão na Jangada de Pedra nascida no Ano da Morte de Ricardo Reis, Todos os Nomes ensaiados com Lucidez, para o Homem Duplicado pregar O Evangelho segundo Jesus Cristo, utilizando O Memorial do Convento para dissertar sobre As Intermitências da Morte.

Na Terra do Pecado dirá os Poemas Possíveis Deste Mundo e do Outro, como se fossem A Bagagem do Viajante escrita segundo o Manual de Pintura e Caligrafia e contando a História do Cerco de Lisboa.

Hoje é dia de Saramago lançar As pequenas memórias, que as grandes já por cá estavam nos Cadernos.

São oitenta e quatro anos de uma vida cheia, um Objecto quase fidedigno da história das últimas décadas de Portugal, com Provavelmente alegria da missão cumprida.

Parabéns, Saramago, com a Cegueira de quem gosta da obra.

segunda-feira, 6 de outubro de 2014

Palavras simples

Acabei de ler Alabardas, o único romance que, se não houver "arca", Saramago iniciou e não teve tempo de terminar. Vem acompanhado de alguns apontamentos dos Cadernos e de dois textos da autoria de Fernando Gómez Aguilera e Roberto Saviano, para além de ilustrações de Gunter Grass.
Descontando a clara estratégia comercial da nova editora da obra do Prémio Nobel, é sempre saboroso mesmo sabendo a pouco, ler Saramago "novo".
Como ele dizia e Saviano relembra no texto "É o que as palavras simples têm de simpático, não sabem enganar".
Uma pequena amostra, com o respeito integral da grafia publicada:
"(...) Estou a ouvir, Li em tempos, não recordo onde nem exactamente quando, que um caso idêntico sucedeu na mesma guerra de espanha, um obus que não explodiu tinha dentro um papel escrito em português que dizia Esta bomba não rebentará, Isso deve ter sido obra do pessoal da fábrica de braço de prata, eram todos mais ou menos comunistas, Nessa altura parece que havia poucos comunistas, E algum que não o fosse, seria anarquista, Também pode ter sido gente da tua fábrica, Não temos cá disso, Braço de prata ou braço de ouro, o gesto é idêntico, com a diferença importante de que neste caso ninguém terá sido fuzilado, ao menos que se tivesse sabido, Ao contrário do que pareces pensar, não reclamo fuzilamento para os culpados de crimes como esse, mas apelo para o sentido de responsabilidade das pessoas que trabalham nas fábricas de armas, aqui ou em qualquer outro lugar, disse artur paz semedo, Sim, o mesmo tipo de responsabilidade que fez com que nunca tivesse havido uma greve nessas fábricas,(...)
José Saramago
Alabardas
Porto Editora  2014

terça-feira, 8 de outubro de 2013

José Saramago

O Blog tem andado em estado vegetativo, em hibernação, em descanso, a ver onde chega a desfaçatez, a apreciar as voltas, reviravoltas e cambalhotas do mundo político, a deliciar-se com a nova dinâmica das autarquias, a apreciar os conselhos e as opiniões de Belém e a preparar-se para um novo ano, resignado, condenado à crise e aos ditames de quem, com muito sacrifício, vela por nós.
Hoje regressa apenas para assinalar que a atribuição do Nobel da Literatura a José Saramago foi há 15 anos e deixar aqui expresso, uma vez mais, o apreço por toda a obra do grande escritor e vincada a falta que faz o seu comentário certeiro, arguto e sem peias.

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

Livros (lidos ou em vias disso)

Em 1986 José Saramago romanceou uma hipotética fractura nos Pirenéus, que colocou a Península Ibérica a navegar no Atlântico, num afastamento inesperado, surpreendente e contínuo, do continente europeu.

Já pouco recordava do livro, que devo ter lido à pressa, mas havia qualquer coisa que me ordenava voltar a ele. Vou a meio e acabei de degustar ( a Natália Correia dizia aos subalimentados do sonho que a poesia era para comer) o discurso aos portugueses feito pelo primeiro-ministro criado pelo Nobel.

"(...) Portugueses, durante os últimos dias, com súbita intensificação nas últimas vinte e quatro horas, tem vindo o nosso país a ser alvo de pressões, que sem exagero poderei classificar de inadmissíveis, provenientes de quase todos os países europeus onde, como é sabido, se têm verificado sérias alterações da ordem pública, que se viram subitamente agravadas, sem qualquer responsabilidade nossa, pela descida à rua de grandes massas de manifestantes que, de maneira entusiástica, quiseram exprimir a sua solidariedade com os países e povos da península, o que veio evidenciar uma grave contradição em que se debatem os governos da Europa, a que já não pertencemos, diante dos profundos movimentos sociais e culturais desses países, que vêem na aventura histórica em que nos achamos lançados a promessa de um futuro mais feliz e, para tudo dizer em poucas palavras, a esperança de um rejuvenescimento da humanidade. Ora, esses governos, em vez de nos apoiarem, como seria demonstração de elementar humanidade e duma consciência cultural efectivamente europeia, decidiram tornar-nos em bodes expiatórios das suas dificuldades internas, intimando-nos absurdamente a deter a deriva da península, ainda que, com mais propriedade e respeito pelos factos, lhe devessem ter chamado navegação. Esta atitude é tanto mais lamentável quanto é sabido que em cada hora que passa nos afastamos setecentos e cinquenta metros do que são agora as costas ocidentais da Europa, sendo os governos europeus, que no passado nunca verdadeiramente mostraram querer-nos consigo, vêm agora intimar-nos a fazer o que no fundo não desejam e, ainda por cima, sabem não nos ser possível."(...)

A jangada de pedra
José Saramago
Caminho (1994)

segunda-feira, 12 de julho de 2010

José Saramago e o Céu

Para além de um grande escritor, o único (até agora) Prémio Nobel da Literatura da língua portuguesa foi um polemista terrível, sarcástico, cáustico, que nunca virou a cara uma boa refrega, intelectual, entenda-se.
Pelos vistos, nem mesmo a morte lhe cerceou a verve, como se prova pela descrição da sua subida ao céu e da argumentação tida com o Criador. Ler aqui.

sábado, 19 de junho de 2010

José Saramago

Faleceu ontem o único (até agora) Prémio Nobel da Literatura Portuguesa.

Polémico, suscitou paixões e ódios, quase sempre exacerbados. Deve ter sido dos poucos escritores que teve o privilégio de ser criticado por muita gente que dele não leu uma linha.

Um grande escritor, que se tornou conhecido já na fase madura da vida, à custa de uma grande ousadia, uma enorme vontade, um conhecimento profundo das suas capacidades e, de certeza, muito trabalho.

Daqui a 100 anos ainda será lido com o fascínio que os grandes sempre despertam.

"É bem certo que o difícil não é viver com as pessoas, o difícil é compreendê-las, disse o médico"
 
Ensaio sobre a cegueira
José Saramago
Caminho (1995)

sexta-feira, 27 de março de 2009

Livros (lidos ou em vias disso)

"(...) Razões afins levarão um dia a que, no algarve, como alguém terá o cuidado de escrever, toda a praia que se preze, não é praia mas é beach, qualquer pescador fisherman, tanto faz prezar-se como não, e se de aldeamentos turísticos, em vez de aldeias, se trata, fiquemos sabendo que é mais aceite holiday's village, ou village de vacances, ou ferienorte. Chega-se ao cúmulo de não haver nome para loja de modas, porque ela é, numa espécie de português por adopção, boutique, e, necessariamente, fashion shop em inglês, menos necessariamente modes em francês, e francamente modedeschäft em alemão. Uma sapataria apresenta-se como shoes e não se fala mais nisso. E se o viajante pudesse catar, como quem cata piolhos, nomes de bares e buates, quando chegasse a sines ainda iria nas primeiras letras do alfabeto. Tão desprezado este na lusitana arrumação que do algarve se pode dizer, nestas épocas em que descem os civilizados à barbárie, ser ele a terra do português tal qual se cala. (...)"

A viagem do elefante
José Saramago
Caminho (2008)