O blog é, tem sido ou pretendido ser uma catarse, o diário de adolescente que nunca escrevi, um repositório de estórias, uma visão do quotidiano, a expressão de sentimentos, uma gaveta de memória, a manifestação de opinião livre, sem preconceitos nem vassalagem, sem pretensiosismo de qualquer espécie nem ambição de leitores, elogios ou críticas.
Discreto, pacato, por vezes reflexivo, outras impulsivo, à imagem do seu autor. Por aqui têm passado os temas que, em cada momento, me marcaram por qualquer motivo e me deram vontade de registar, aproveitando este arquivo monumental, ordenado e espaçoso que, sem grande trabalho, esta geringonça permite.
É assim que quero continuar, para me surpreender quando percorro os cantinhos da gaveta e descubro o que entendia em tempos idos, no que reparei, onde me levou o sentimento.
Se um dia os meus netos vierem a passear por este arquivo, gostaria que se sentissem tentados a vasculhar o que, nessa altura, já terá desaparecido na voragem do esquecimento.
Acabei há dias o melhor livro de Lobo Antunes, a que já fiz referência
aqui. O meu carácter impulsivo acha sempre que o último livro deste autor é o melhor, mas este é, sem qualquer dúvida, um grande livro! Em três dias, as inúmeras vozes que nele se ouvem caminham por situações da vida, numa beleza de escrita onde cada palavra é aquela e não podia ser outra, onde cada imagem é mais bela do que a anterior, onde cada descrição só ficava perfeita com aqueles pormenores, onde cada um diz o que deve no momento certo, mesmo que a voz seja a do irmão surdo da professora angustiada com as complicações da vida, que decide juntar-se ao irmão, no mesmo mar onde ele mergulhou e a cabra caiu, junto à casa de praia onde não se passava o muro para brincar, por do lado de lá morar gentinha. Deve dar muito trabalho escrever assim!
A convalescença do corte também tem algumas vantagens e esta é uma delas: tem-me permitido ler (muito) quando quero e como quero.
Agora estou na fase das novidades: depois de Lobo Antunes (
Não é meia noite quem quer), já vai avançado o
Cafuné de Mário Zambujal, mais leve que o anterior, onde, com prosa deliciosa, se contam as aventuras, desventuras, sonhos e realidades de um Rodrigo Favinhas Mendes, que viveu em Lisboa por alturas das invasões francesas. Seguir-se-á Mario de Carvalho (
O Varandim), Rui Cardoso Martins (
Se fosse fácil era para os outros) e Bruno Margo (
Sandokan & Bakunine). Gosto variado, prosas diferentes, leitura diversa.
Nos intervalos, as caminhadas, a crise, o orçamento, o Gaspar, o Portas e o Coelho, que não devem ter tempo para ler, tão afadigados que estão em obedecer àqueles
funcionários de segunda, que ditam as regras
impostas por aquela senhora alemã, cujo nome não me ocorre, mas que usa casaquitos parecidos com os meus, porém bem mais feios ...