terça-feira, 6 de agosto de 2024

Aventuras

Acordo . Um barulho esquisito, difuso, longe, numa divisão que não consigo identificar à primeira. Estarei a sonhar? O sol ainda não nasceu e a claridade do dia mal perpassa pelas nesgas do estore. Toda a casa está em silêncio e no escuro. Apuro o ouvido. Alguma coisa bate em algo, de quando em vez

"Batem leve, levemente, como quem chama por mim ..."

Levanto-me e sigo a intuição. Não é chuva nem é gente e neve é visitante muito, muito raro nesta zona e nunca neste tempo. Acendo as luzes e o barulho acentua-se. Facilita a deslocação e a identificação do local donde provém. Pasmo! Há um pássaro na lareira, a lutar contra o vidro. Deve ser um aventureiro que tentou desvendar o mistério da escuridão do fumeiro. Veio até cá abaixo e, claro, já não conseguiu subir.

Abri a lareira. O pardal saiu de rompante, mal me dando tempo para o identificar. Procurou a luz, pousando no cimo dum móvel, aflito. Era um pardal-telhado, um charéu, um telhadeiro, adulto, daqueles que na minha infância terminavam, muitas vezes, no braseiro ou na frigideira. Amedrontado, perdido, decerto com o coraçãozito em velocidade supersónica.

"O pardal daninho aos campos / não aprendeu a cantar. Como os ratos e as doninhas, apenas sabe chiar." 

Apenas chiava, baixinho, na sua aflição em busca da saída. Encaminhado pela luz e pelas portas que se iam abrindo, lá chegou, finalmente, àquela que lhe deu acesso ao quintal e a um tronco da ginjeira, onde pousou, olhando, pareceu-me que agradecido.

O caminho para a liberdade não foi fácil. E alguma vez é?

2 comentários:

Carlos JPC disse...

Acordado pela passarinha…..

Anónimo disse...

"Eu ouvi um passarinho às quatro da madrugada"! 🤣