AI SILVINA, AI SILVININHA
Lindos olhos tem Silvina,
lindas mãos Silvina tem,
e a cintura de Silvina
é fina como o azevém.
Em Silvina tudo exala
um cheiro de coisa fina,
mas o que a nada se iguala
é a fala de Silvina.
A doce voz de Silvinaé como um colchão de penas,
é um fio de glicerina,
um vapor de águas serenas.
- Porque não cantas, Silvina?
Se a tua voz é tão doce
talvez cantada que fosse
mais doce que a glicerina.
Porque não cantas, Silvina?
- Não me apetece cantar
e muito menos para ti.Eu sou nova, tu és velho,já não és homem para mim.- Não me tentes, Silvininha,que eu já não te olho a direito.Sou como um ladrão escondidona azinhaga do teu peito.
- A azinhaga do meu peitocorre entre duas colinas.O ladrão do meu amortem pé leve e pernas finas.- Canta, canta, Silvininha,uma canção só para mim.Dar-te-ei um lençol de estrelas,uma enxerga de alecrim.
- Deixa o teu corpo estendidoà terra que o há-de comer.A tua cama é de pinho,teus lençóis de entristecer.- Canta, canta, Silvininha,como se fosse para mim.Dar-te-ei um escorpião de oirocom um aguilhão de marfim.
- Não quero o teu escorpião,nem de ouro nem de prata.Quero o meu amor trigueiroque é firme e não se desata.- Pois não cantes, Silvininha,se é essa a tua vontade.Canto eu, mesmo assim velho,que o cantar não tem idade.
Hás-de tu ser morta e fria,cem anos se passarão,já de ti ninguém se lembranem de quem te pôs a mão.Mas sempre há-de haver quem canteos versos desta canção:Ai Silvina, ai Silvininha,Amor do meu coração.
Poesias Completas (1956-1967)
António Gedeão
Portugália (1975)
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