A "velha dos pombos" continua por lá, ora sentada num dos bancos da Rua da Vitória ora na soleira da porta de um prédio da Rua Augusta (a tal que, a par do Cais da Ribeira, no Porto, deve ser visitada pelo menos uma vez na vida), indiferente à chuva e ao frio, sempre rodeada pelos pombos, a fazer anotações no bloco que retira da saia, juntamente com o lápis, grosso, com que escreve. Ralha consigo, com os pombos, com os transeuntes que caminham indiferentes, com o tempo, com a vida. Ser-lhe-á indiferente, a vida, como a sua presença é aos caminhantes apressados? Que irá naquela cabeça quando, de manhã, arrasta as malas e se desloca do "alojamento" nocturno para o(s) sítio(s) onde irá passar o dia? Deve preocupar-se pouco e manter-se alheia a todas as polémicas que, tal qual o temporal, têm assolado o país nestes últimos tempos.
Dos quadros de Miró, que o homem do BPN comprou, decerto com grande sacrifício, para figurarem no balanço do Banco dando-lhe o toque chique que é sempre útil, às declarações sem nexo do Primeiro-Ministro e do seu "ajudante" para a Cultura, Barreto de sua graça, às trapalhadas com os investigadores (aqui não sou "tocador" de ouvido) agora culminadas com os vistos "gold" oferecidos a quem vier para este cantinho solarengo tomar o lugar dos que foram forçados a abandoná-lo, passando pelos discursos inócuos e vazios de sentido de toda a classe política, oposição incluída, dos números do desemprego que provam ser a estatística a única ciência exacta, das praxes e do Meco, da chuva e do vento, dos alertas e suas cores, do mar e das marés, tudo surge em catadupa, "mastigado" e "deglutido", para ser consumido de forma rápida e usando apenas os olhos e os ouvidos, desprezando o potencial que a cabeça guarda no seu interior (às vezes tenho dúvidas se isso não será só para alguns).
Não é fácil ser "padre nesta freguesia", mas faz-se um esforço … lê-se a última crónica de António Lobo Antunes na Visão e fica-se fascinado com a forma, sublime, como se descreve a amizade por um irmão que partiu; no cinema, vê-se Steve McQueen recordar que a escravatura existiu até há bem pouco tempo (não existirá ainda?) em "12 anos escravo", Brian Percival relembrar os horrores da guerra, os crimes do nazismo e a importância de aprender a pensar, na adaptação do romance de Markus Zusak "A rapariga que roubava livros" e, para quem ainda tivesse dúvidas, Martin Scorsese ilustrar, com base numa história verídica, ao que leva a ambição desmedida e a falta de valores, em "O Lobo de Wall Street".
Mantendo sempre as rotinas, está quase no fim o romance de Mário Ventura, "Évora e os dias da guerra", passado após a restauração da independência, na tomada da cidade alentejana pelos castelhanos comandados pelo filho de Filipe IV, que culmina na batalha do Ameixial, já no reinado de D. Afonso VI e, do Expresso desta semana, reter a crónica de Miguel Sousa Tavares e o inconformismo de Nicolau Santos, demonstrando que ainda vai havendo teimosos, tal qual o meu pai que tem quase 92 anos e o meu neto, do meio, que ainda não fez 3.
E por aqui me quedo!
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