"(...) Fala de Matias Kirimi
O padre não era branco. Mas, naquele momento, ele agia como se fosse um deles. E sempre que os brancos querem saber quem sou, levanto as mãos para que vejam que estou desarmado. Os meus braços são asas inúteis. Sou como as aves domésticas: nem o céu nem o chão me pertencem. Assim, de braços abertos e as mãos rendidas, os brancos acreditam que, mesmo que eu bata as asas, eles serão donos do meu voo.
Há pouco, quando saltei para o caminho, soletrei devagar o meu primeiro nome como se aquele <<Matias>> me tornasse menos preto. O padre sorriu, com altivez. Não fazia ideia de que lhe entregava a casca para salvar o fruto. Procedi assim porque há muito que estou avisado: é pelo nome que nos começam a roubar a alma. No momento seguinte, como eu já adivinhava, o padre perguntou pela minha tribo. O nome e a raça não bastavam. Nos tempos de hoje, disse eu, ninguém sabe quem é quem, nem de onde vem.
No final, o padre voltou ao assunto da cor da pele. Disse que eu era demasiado claro para ser um negro retinto. Respondi que não sabia responder. Ele que me dissesse de que raça eu era. Essa é a especialidade dos brancos: as raças. (...)"
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