Podia ser um texto sobre a actualidade, a época natalícia, as desigualdades, o sofrimento, as diferenças, tudo o que a nossa imaginação queira. Nada disso! Apenas um excerto de um capítulo de um livro deliciosamente bem escrito.
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(...)
XXVI
O Volframista
Coisas que ainda se passarão: guerra, corrida ao volfrâmio, o dinheiro que isso traz. Bem jogado naquelas mesas - legais e ilegais. O Volframista começou por procurar as ilegais. Vinha sozinho, sério, um lenço branco no bolso esquerdo do casaco do fato. Depois começou a trazer uma mulher, de saia reta pelo joelho, algumas transparências, cabelo a la garçonne, exigindo que se sentasse a seu lado. Fumava por uma boquilha, a com o cabelo de rapaz. Ele era um novo-rico do volfrâmio, ou tungsténio, garampilheiro a vender a quem guerreava. Corrigindo: a quem mandava os outros matarem-se, sentados em poltronas confortáveis, as mangas da camisa imaculadas. O torturador também lê poesia. Vender-lhes o mineral fazia enriquecer muito rápido.
Dele contavam-se coisas medonhas. Que apostaria tudo na mesa, até a virgindade da filha. Já o tinha sugerido, quando vinha sozinho. E todo aquele monte de dinheiro a crescer, e nada para o parar - as cagadelas caíam à sua frente, nunca em cima de si. Não era preciso salto de fé, só assegurar a boa posição na corrida ao ouro negro. Com um bom número de mortes dos trabalhadores por silicose, pulmões feitos pedra. Havia que continuar a explorar o volfrâmio.
Qu'é isso?
Descoberto pelos irmãos Don Fausto e Juan José Delhuyar em 1783.
Elemento químico metálico (símbolo: W).
Número atómico 74.
Massa atómica 183,85.
Cor pardacenta, quase preta.
Densidade de 19,3 g/cm3.
Funde a cerca de 3419 ºC.
Uma merda pra fazerem armas, munições ou coisa co valha.
O tambor que o mar é ao bater na rocha. Falam do Volframista na praia, tratando das redes. Recordando pela centésima vez o que lhes disse o homem.
Sou como vocês, vou sempre ao leme.
Que leme, homem? Estes barcos não têm leme. (...)
Faina
Marta Pais Oliveira
Gradiva (2024)
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