segunda-feira, 17 de julho de 2023

Sonhos

Desce a rua, como sempre a cantarolar e com o sorriso aberto, escancarando os dentes branquíssimos, bonitos, certinhos, de fazer inveja a muita gente. O cabelo, entrançado, cai-lhe pelas costas.

- Bom dia. Posso lhe pedir uma coisa?

O sotaque denuncia a origem africana, mas faz sempre um esforço para falar o português de cá. 

- Claro! Se eu puder ...

Terá catorze, quinze anos. É a terceira de quatro irmãos e a única rapariga. Deve sonhar ser cantora. Exercita os seus dotes sempre que não está ninguém por perto, cantando forte e deliciando-se com a sua habilidade vocal. Se surge alguém, o volume baixa de imediato.

- Vou fazer um trabalho na escola, sobre a casa dos meus sonhos. Quero lhe pedir se me deixa tirar fotografia à sua.

- Claro que sim.

- Obrigada. Não iria tirar sem me dar autorização.

Sendo o horizonte diminuto, os sonhos tornam-se minúsculos.

Sem comentários: