segunda-feira, 18 de março de 2024

Incómodos

Faltam quinze minutos para a hora prevista. A sala, antiga mas sempre bonita, está bem composta, apesar de ser meio da tarde de Domingo. Na fila reservada, apenas estão sentadas duas "jovens", nos dois primeiros lugares da coxia. Devem ter vindo "de véspera", que a idade acentua a pressa e o receio de chegar atrasado. Nenhuma é "A senhora de Dubuque", que só aparecerá daí a pouco, em cima do palco.

Pede-se licença, antecedida das desculpas devidas pelo incómodo. Recebe-se, em troca, um ar enfatuado, acompanhado pelos raios de dois olhares faíscantes, como quem diz:

- Olha que chatos. Não podiam ter vindo mais cedo?

Não se levantam. Rodam um pouco as pernas, devagar, dando mostras do desagrado que a situação lhes causa. Nas mãos de ambas está o utensílio indispensável para qualquer pessoa de "bom gosto" e com necessidade premente de não perder pitada do que vai acontecendo no mundo. Já sentado, reparo melhor: afinal não são mensagens, notícias ou redes sociais; as cartas evoluem no ecrã e o jogo desenrola-se com bastante rapidez. Os dedos são ágeis e denotam bastante prática.

A instalação sonora do teatro anuncia que o espectáculo vai começar, que é proibido gravar ou fotografar e que os telemóveis deverão ser desligados. O jogo prossegue e termina com uma vitória, premiada com foguetes no visor.

- Consegui! Mas foi difícil ...

A interlocutora não faz comentários. Talvez o tempo não lhe tenha permitido chegar ao fim e o seu mau humor volta a mostrar-se.

As luzes apagam e os aparelhos são guardados na mala já com tudo escuro.

A peça, felizmente, não foi incomodada e valeu bem a deslocação.

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