sexta-feira, 9 de setembro de 2022

Escuridão

Os estores estão sempre corridos, as portas e as janelas fechadas. Vivem enclausurados em casa e passam dias sem dela saírem. Os contactos resumem-se a um meneio de cabeça, com um sussurro de saudação.

O "chefe", logo pela manhã, vai comprar o pão. Rapidamente regressa ao "paraíso", onde tudo se encontra blindado. A porta abre-se. Fecha num instante, não permitindo indiscrições internas. Se o carteiro ou alguém toca a campainha, abre-se uma nesga para ouvir o que o visitante tem para contar ou entregar. Tudo extremamente rápido, que há muito para fazer internamente.

À noite, o "chefe" pega no carro e vai dar uma volta, normalmente sozinho. Não demora muito! As luzes são apagadas ainda antes de o carro estar devidamente arrumado no quintal. Raramente a família sai em conjunto e, quando isso acontece, é uma aventura digna de registo. O chefe instala-se ao volante; uma das filhas traz um saquinho, que coloca na mala; a outra surge daí a pouco, com outro saquinho, que vai para o banco de trás; a mãe é a última a chegar, movendo-se com alguma dificuldade e trazendo mais um saquinho.

Com toda a gente instalada, o "chefe" põe o motor a trabalhar. Alto! Falta qualquer coisa! A mãe sai e o motor continua a fazer barulho. Por pouco tempo. O "chefe" acha a demora muita e a gasolina está cara. Desliga-o. A mãe regressa, sem nada nas mãos. Instala-se no "lugar do morto". Sai a filha mais velha. Não demora quase nada e traz mais um saquinho. Finalmente, estão reunidas as condições para a viagem e a marcha inicia-se. 

Regressarão à noite, já no sossego e com a reserva de que tanto gostam. 

A conta da luz deve ser enorme ou serão corujas?

Sem comentários: