quinta-feira, 11 de maio de 2023

Alcatruzes

No balcão da clínica onde me havia deslocado para uma consulta de rotina, surgiu a confrontação com o 25 de Abril, quando a menina do atendimento, simpática, quis confirmar que o cliente postado na sua frente era mesmo este e não outro.

- Qual a data do seu nascimento?

- 25 de Abril de 1952.

- 25 de Abril?! Engraçado ...

- Sem dúvida. Foi no dia em que fiz 22 anos e nunca mais me esquecerei.

- Eu ainda não tinha nascido, nem jeito ...

Deveria ter 28, 30 anos, não mais. Mas sabia que o 25 de Abril tinha acontecido e era qualquer coisa importante, o que, nos dias de hoje, começa a ser cada vez mais raro.

- Olhe que isto está muito mal ... não sei se valeu a pena.

- Tem essa opinião porque não viveu no tempo "da outra senhora" e não faz a mínima ideia de como era. E ainda bem!

Mais duas ou três frases de circunstância, feito o registo que se pretendia e dada a informação necessária, a despedida. Era necessário atender outro cliente, dos vários que aguardavam.

O tempo, que passa a correr, limpa a memória dos mais velhos e cria o "quero lá saber disso" nos mais novos. Nada disto é privilégio destes tempos, embora pareça acentuar-se. Lembro-me bem de, na década de sessenta do século passado, dar por mim a questionar a razão pela qual um grupo de "velhos" organizava um almoço comemorativo do 5 de Outubro de 1910, uma evidente inutilidade para uma data tão longínqua.

A nora da vida não cessa o seu trabalho constante.

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