terça-feira, 27 de outubro de 2020

Livros lidos (ou em vias disso)

Uma língua não tem necessidade de formatação obrigatória e só ganha com a diversidade.

(...) eu sei que muita gente diz que o camarada Jesus vive nos céus e que o paraíso e mesmo o inferno ficam lá em cima, mas para mim, assim de repente a olhar

aquela belezura

como o meu pai gosta de dizer

para mim o paraíso ficava dentro daquela caixa com cheiro de mil chocolates lindos que nem derretiam os formatos de conchas do mar, búzios, caranguejos, cores que imitavam o bolo mármore da tia Maria, creme a fingir que era castanho,  preto a  misturar-se com  um branco cor  de leite com  café e o cheiro também, todos de boca estávamos só com os olhos bem abertos que até o meu pai e a minha mãe riram quando eu a e mana Tchi, a olhar aquela quantidade de cores e cheiros, tivémos que iniciar de bater as palmas como se fosse comício do 1º de maio, e a Yala também nos imitou

- viva os camaradas vizinhos franceses!

eu gritei

- viva! 

todos responderam

- viva essa caixa de chocolate

- viva!

- obrigado, camaradas

eu imitei um camarada que sempre terminava os comícios com essa frase 

quando o pai deu o sinal de largada, depois de brindarmos àquela enorme caixa que tinha aparecido tão bem vinda no nosso natal, eu pensei que fôssemos comer bem rápido até a mãe nos mandar parar para respirar 

aquela caixa era quase de magia, não eram só as cores misturadas e os cheiros lindos; não era só o brilho do laço; o sabor, isso posso já jurar aqui pelo meu avô que tá debaixo da terra, o sabor era uma coisa do outro mundo, mas eu tou a falar de um outro mundo que fica ainda mais em cima do que as alturas do tal paraíso ,(...)

O livro do deslembramento
Ondjaki
Caminho (2020)

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