domingo, 6 de abril de 2025

Realidade ?!

Com o mundo "tarifado" pelo homem da popa, vamo-nos entretendo com os preâmbulos da campanha eleitoral que, a 18 de Maio, há-de determinar quem assumirá o poder nos próximos quatro anos, se ...

Há sondagens para todos os gostos e opções, opiniões muito bem fundamentadas com o enorme saber de todos e de cada um, comentários a esmo, certezas absolutas sem hipóteses de serem contrariadas. No tal dia, a noite trará a tradução da vontade dos que se derem ao trabalho de ir fazer a cruzinha. Apesar da manipulação a que está sujeita, será determinante e a única que vale ... por enquanto.

Nessa noite, alguns comentadores "sabões" meterão a "viola no saco", outros exultarão com a alegria de terem acertado na opinião espremida e exprimida antes, o que lhes garantirá a respeitabilidade futura e a continuação da "cátedra".

Desaparecerão o Bolhão e o betão, o abono de família e o IRS, as rendas de casa, os trabalhadores e o povo, até que a nova Assembleia se instale nas cadeiras de S. Bento e se regresse à rotina.

Qual o futuro Governo? Ver-se-á depois! Prognósticos, como dizia o outro, "só no fim do jogo" ...

sábado, 5 de abril de 2025

Palavras bonitas

ELDORADO

Galhardo e galante,
    Um cavaleiro andante,
Ora ao Sol, ora ensombrado,
    Há longo tempo seguia,
    Em alegre cantoria,
Procurando o Eldorado.

    Porém, velho se faz
    Cavaleiro tão audaz -
E o seu coração, pesado,
    Se tolda - pois não achou
    Terreno por onde andou
Que parecesse o Eldorado.

    E quando então, finalmente,
    Se depara, já descrente,
Com um peregrino vulto -
    Lhe pergunta: <<Ó sombra errante, 
    Diz-me tu, onde se oculta
O Eldorado distante?>>

    <<Sobre as Montanhas
    da Lua,
Descendo o Vale Ensombrado,
    Vai, galopa com bravura>>,
    Lhe responde a sombra escura,
<<Se procuras o Eldorado.>> 

Obra Poética Completa
Edgar Allan Poe
Tinta da China (MMXXV)

quinta-feira, 3 de abril de 2025

Cores

O horizonte a provar que "não há mal que sempre dure nem bem que nunca acabe".


quarta-feira, 2 de abril de 2025

Regresso

De regresso à base, tudo como dantes, até o quartel em Abrantes ... e a chuva, que parece ter ido de férias na mesma altura, voltou hoje. Invejosa!

Afinal, decorridos estes (poucos) dias de ausência, o problema de Montenegro mantém-se por esclarecer; Marcelo continua a comentar tudo e a pedir a paz entre a Federação de Futebol e o Comité Olímpico, cujos "comandantes" estão a dar lições de desportivismo sério e exemplar; o homem da popa amarela lá vai "tarifando" e "ordenando" o fim da guerra e dos livros de que não gosta.

Mas houve mudanças bem agradáveis: o jardim está mais florido, anunciando a chegada da Primavera; nas ginjeiras vão surgindo muitas folhinhas verdes; apareceram morangos bem vermelhinhos. Confirma-se, uma vez mais que, pelo menos em parte,  "o mundo é composto de mudança".

sábado, 29 de março de 2025

sexta-feira, 28 de março de 2025

Arte

O corvo visita todos os lugares e acompanha as visitas. À falta de melhor, até as mãos erguidas em prece pela mão, brilhante, do artista, servem para descansar um pouco e apreciar uma grande paisagem museológica.

quinta-feira, 27 de março de 2025

Surpresa

Alguém imaginaria ser possível a capital do Algarve chegar à homónima do Azerbaijão antes de mim?

Mas chegou e por cá vai permanecer, sem visto nem passaporte.

quarta-feira, 26 de março de 2025

segunda-feira, 24 de março de 2025

Babosices

Vão ser mais de meia dúzia de milhares de quilómetros, cerca de uma dezena de horas no ar, quatro horas de diferença horária, uma civilização e um país completamente novos, com tudo o que isso tem de aventura.

Fácil não vai ser, mas vai valer a pena!

À espera, estarão filho e nora, e dois netos lindos, enormes, gentis, que serão abraçados sem "dó nem piedade", com as saudades que se foram acumulando desde o Natal.

A noite de hoje será, ainda, "portuga". A de amanhã trará sonhos em azeri.

sexta-feira, 21 de março de 2025

Dia Mundial da Poesia

A FORMA JUSTA

Sei que seria possível construir o mundo justo
As cidades poderiam ser claras e lavadas
Pelo canto dos espaços e das fontes
O céu o mar e a terra estão prontos
A saciar a nossa fome do terrestre
A terra onde estamos - se ninguém atraiçoasse - proporia
Cada dia a cada um a liberdade e o reino
- Na concha na flor no homem e no fruto
Se nada adoecer a própria forma é justa
E no todo se integra como palavra em verso
Sei que seria possível construir a forma justa
De uma cidade humana que fosse
Fiel à perfeição do universo

Por isso recomeço sem cessar a partir da página em branco
E este é o meu ofício de poeta para a reconstrução do mundo

O nome da coisas
Sophia de Mello Breyner Andresen
Caminho (2004)

quinta-feira, 20 de março de 2025

Livros (lidos ou em vias disso)

"(...) Viver será também a nossa contribuição privada para a estatística? E por que os jogos exercem sempre um fascínio tão grande? E a guerra, será ela o jogo dos jogos? <<A guerra é inimiga do desenvolvimento sustentado>>, gritava kota Venâncio já fora de si. <<Não, ó kota, nem pensar>> interpelava-o Samuel Zau a fazer cócegas à inteligência. <<Este é apenas um país em que a morte está muito concorrida, mas isto passa>>. E, Zico, alheado da discussão, espreitando da linha de fundo, entregava-se a outro dos seus passatempos preferidos, que era encontrar relações secretas entre a vida e a matemática. A vida é uma curva num espaço de n dimensões ou será uma série convergente composta por termos lineares? Sim, uma série convergente, talvez seja isso. Serviço mais aulas mais Mity mais casa mais cinema mais amigos mais festas mais o Homem-Jibóia mais discussão sobre a guerra, tudo isso não seria uma série de Fourier? <<E sabes que mais>> gritava kota Venâncio <<a minha esperança, a minha última esperança é que, com o desenvolvimento da sociedade, a guerra se converta num tabu, é a única forma de acabar>>. Pausa geral. <<Um tabu? Explica lá isso, ó kota, troca-me essa abstracção por miúdos>> contrapunha Samuel Zau. <<Sim, um tabu>> repetia o kota Venâncio Seboleiro. Fez uma pausa, inspirou o ar da tarde morna. <<Se olhares para a evolução das sociedades chegou um período em que o incesto, em função dos resultados negativos que produzia, foi banido, virou um tabu e pronto, a endogamia acabou. Agora explica-me por que isso não pode suceder com a guerra?>> interrogava o kota, acentuando com clareza a pertinência do argumento. Mas Samuel Zau não estava convencido, <<Ó kota, isso não pode ... isso é mambo pesado ... a guerra faz parte da natureza humana... onde há homem há guerra... acabar a guerra é como pedir esmola a um ladrão ou pôr um vegetariano a chefiar um talho>>. E o kota, sempre em forma, a ripostar: <<Mas aí é que está o mambo. O incesto produzia algumas dezenas de crianças atrasadas numa sociedade mas a guerra produz milhares, a guerra trivializa todas as mutilações e afecta duas, três gerações, que se perdem completamente. Isto não é irracional?>>(...)"

Desconseguiram Angola
António Costa Silva
Guerra & Paz (2025)

quarta-feira, 19 de março de 2025

Dia do Pai

Logo pela manhã, bem cedo, os meus filhos deram-me os bons dias, um lá de longe, bem longe, a outra bem perto, numa visita relâmpago antes da labuta.

Eu, que já não posso dar os parabéns ao meu - faria hoje 103 anos -, deixo-lhe um pequeno poema do grande Torga.

MEMÓRIA

Chove.
Mas, afinal, já chove há muitos anos ...
O mundo dos meus pés nunca se move
Sem chuva, tristezas e desenganos ...

Apesar disso, 
Lembro-me perfeitamente bem
Do luminoso sol de certo dia ...
Um lindo sol que doirava
Num toco que rebentava
Uma folha nascia.

Diário I
Miguel Torga
Gráfica Coimbra

terça-feira, 18 de março de 2025

Tempos que correm ...

Passaram cinco anos sobre o suplício que foi a pandemia do vírus "Corona"; a guerra na Ucrânia já ultrapassou os três; o conflito israelo-árabe (fica bem, escrito assim) dura há quase oitenta. Por mais que o Papa apele, não parece que alguém o ouça nem que haja alterações, ou melhor, decisões que acabem com este mundo de interesses, hipocrisias e "lata".

Hoje, mais umas centenas de palestinianos foram mortos; um sem número de ucranianos e russos devem ter seguido o mesmo caminho; outros "muitos" pereceram pelo resto do mundo e já nem notícia são.

A ONU e o "nosso" Guterres nem se ouvem, mas continua a haver muita esperança: o cavaleiro russo e o americano da popa amarela "namoraram" mais de duas horas. Foi só ao telefone, claro, mas há muitos casamentos que começam assim ...

domingo, 16 de março de 2025

Registos

Há 51 anos, uns quantos "rapazes" apressados marcharam sobre Lisboa e mostraram a toda a gente que algo ia mal no nosso "reino" e que era imperioso mudar.

A data ficará na História, registada com uma nota de rodapé, importante, mas não fundamental.

Contudo, sem dúvida que merecerá bem mais destaque do que a "notazinha" que há-de referenciar o Governo de Montenegro, agora caído da tripeça.

Mudar é a palavra que os dois acontecimentos terão em comum nos registos históricos.

sábado, 15 de março de 2025

Aperitivos

O espumante, branco, era bruto e fabricado na adega onde iria decorrer o evento. Há já dois dias que havia sido colocado no gelo, em grandes alguidares, para que se mantivesse fresco. Ali não havia frigorífico e as visitas eram importantes (a fina flor da alta sociedade). Estavam muito habituadas ao champagne francês. Não se podia correr o risco de não gostarem do nosso.

Na semana anterior, tinha havido uma grande festa citadina em Cascais e o "campo" não podia ficar mal. Tinha sido escolhida a adega, para recrear um ambiente rural que a maior parte desconhecia.

Os aperitivos - pinhões, tremoços e pevides - despertariam a sede para que o espumante lavasse bem a goela e criasse as condições óptimas de degustação do repasto.

- Não vais lá almoçar, claro, mas queria que lá estivesses com o Peugeot. Pode ser necessário vir à quinta buscar alguma coisa que falte.

Tudo tratado e (bem) planeado. As cozinheiras cuidavam das panelas e dos tachos, o cheirinho aguçava o apetite, antevia-se o sucesso. Havia canja, coelho, galinha, porco, cabrito, borrego, vitela, feijão branco e verde, ervilhas, batatinhas no forno e fritas, jaquinzinhos, bolinhos de bacalhau, rissóis de camarão e muitos outros pitéus que a memória já limpou. Só o cheiro saciava o apetite.

Os criados, vestidos de um branco imaculado e com o lacinho preto ao pescoço, iam servindo o espumante e repondo os aperitivos nos pratos, até ser dada ordem para os convivas se sentarem nas mesas. Os lugares tinham sido previamente estabelecidos e escolhidos de acordo com regras bem definidas. Casais separados, muito cuidado com alguns "ódios de estimação", de forma a tornar o ambiente descontraído e sem mácula.

- Preciso que vás à quinta levar uma senhora. Está muito mal disposta. A C. vai contigo e tu ajudas a levá-la para um quarto.

Com alguma dificuldade, a senhora foi deitada no banco de trás. Sossegadinha, gemia, soluçava, tossia, vomitava para um saco que a C. segurava. Não foi fácil levá-la até ao quarto e deitá-la na cama, mas lá ficou. Não deu pela viagem e nem fazia ideia onde estava. Baralhações ...

Só pode ter sido dos tremoços. Ou seria dos pinhões? As pevides quase de certeza que não, embora, por vezes, causem alguns embaraços estomacais e intestinais.

Uma coisa é certa: do espumante não foi! Era bruto ... mas de muito boa qualidade. 

quarta-feira, 12 de março de 2025

1884 ou 2025

"(...) Ainda se não disse tudo.

Neste espaço de literatura da decadência, ou decaída de todo, observe a crítica escorreita que há dois projectos: um é patente, o outro é clandestino. O primeiro é - arrasar Inglaterra; e, com efeito, arrasa-se. O projecto clandestino, um tanto arteiro, é obter pelo sofisma tortuoso da letra redonda, tipo Elzevir, o que o merceeiro alcança com o correcto silogismo dos azeites e dos farináceos. O Espiritual ousa correr o pário com o Comestível: a meta é o hábito de Cristo. Que o merceeiro, melindrado na sua prosápia de antropóide, não se agaste, se eu o lanço nestas correrias de hipódromo. Não lhe conheço outros dons que o habilitem a entrar no sport.

Enfim, quando voltares a ministrar os negócios do reino, Tomás Ribeiro, não me percas de olho o meu hábito de Cristo, merecido pela façanha heróica e pouco trivial de arrasar Inglaterra. Bem vês que estas ambições aliás temerárias, confesso, não ultrapassam desmedidamente as balizas do meu merecimento. A almejada venera é a ínfima, penso eu, a mais piranga característica étnica da raça que domina esta nesga rasgada da Espanha (que mo releve dom Jaime) - umas noventa léguas, metade incultas; e, assim mesmo, na povoação dessa metade, inçam e pompeiam, segundo conta o Almanaque Comercial para 1884, cento e vinte e dois condes, trezentos e quatro viscondes, e cento e noventa barões. Quanto a comendadores, quem contou as gotas do Mediterrâneo, as areias do Saara e as estrelas da Via Láctea? (...)"

Vinho do Porto
Camilo Castelo Branco
Frenesi (2001)

terça-feira, 11 de março de 2025

Memórias

O dia permanece na minha memória como se fosse ontem, ou melhor, aparece sempre no "ecran" do  meu "computador", e bem mais nítido do que aquilo que ontem fiz.

Dizem os entendidos que é normal. À medida que os anos vão passando, as gavetas antigas da memória surgem à tona, bem abertas, e escamoteiam as modernices que aconteceram nos últimos tempos. No recente, a gaveta desaparece e nem sequer o móvel se nota.

Já lá vai meio século. Tudo se alterou e os olhos de hoje não servem nem podem "ver" claramente "visto" aquilo que se sentiu nesse tempo. Porém, a gaveta tem este vício de se continuar a mostrar anualmente.

O perigo, nessa época, vinha de cima, duns helicópteros que rosnavam a bom rosnar e voavam quase a rasar os telhados mais altos. Por mais inconsciente que se fosse, havia um buraquinho ao fundo das costas ...

Agora são drones, silenciosos, e bem mais perigosos!

domingo, 9 de março de 2025

Velocidade

Notícias de última hora:

  1. A minha menina faz hoje anos e é uma respeitável senhora, mãe de dois "matulões" que não param de crescer;
  2. O tempo foi multado por excesso de velocidade e, de acordo com fontes bem informadas, vai ser colocado sob controlo apertado, talvez com pulseira electrónica, de forma a prevenir esse seu desaforo.

Veremos se o ponto 2. se concretiza, o que não é crível nestes tempos de fake news.

Entretanto, a Casa exulta com mais um aniversário da mais velha dos dois rebentos que por aqui cresceram e se fizeram grandes.


sexta-feira, 7 de março de 2025

Contas

Por muito que ache que não deve, a minha irmã faz anos, de novo, hoje. Continua a não querer saber quantos nem aceita que outros façam as contas e divulguem o resultado. A matemática, para este efeito, é uma ciência sem importância e à qual não dá qualquer relevância. 
A poesia, sim: permanece sempre actual, seja escrita hoje, ontem ou amanhã. E nunca, mas nunca mesmo, tem necessidade de mencionar os anos que tem.

Perguntas quanto tempo deves rezar?
a papoila na encosta
é vermelha sempre.
 
A poesia em 2013 - Resumo 
José Tolentino de Mendonça 
FNAC (2014)

Podemos desligar o silêncio
que a oficina corrompe
e seguir com a multidão
Ou volver a nós reencontrando
as páginas ardidas
dia a dia
e com o mesmo ritmo colher o sol
como se fosse um fruto
que um estuar só nosso sazonou
Nós os que em breve desistimos
nós que nos reconduzimos
pela nossa mão ao que de nós se espera.

O ritmo do presságio
Sebastião Alba
Edições 70 (1981)

terça-feira, 4 de março de 2025

Carnaval

Está quase no fim a folia! O tempo não ajudou mas vai ser um Carnaval recordado por muitos anos, talvez até para ficar na História e ser objecto de estudo aprofundado pelas gerações vindouras.

Por cá, vivem-se dilemas difíceis de resolver, entre moções de confiança ou de censura, comissões parlamentares de inquérito, vidas privadas e aproveitamentos públicos. O Governo, titubeante, comporta-se como o menino que foi apanhado a fazer malandrices na aula e não sabe o que há-de responder ao professor. Marcelo ainda está a decidir se manda uma carta ao Encarregado de Educação ou prefere o silêncio, que é de ouro e ajuda sempre.

Por lá, bem longe daqui (ou será perto?), o homem da poupa diz, com todas as letras "quem manda sou eu". Trata mal a visita, que teve a lata de não levar fato e gravata, mesmo que fosse curta. Obteve largos aplausos russos, ainda que não se saiba ao certo se foram por ele ter ideias brilhantes ou por ser um enorme idiota.

A Europa assiste, com a senhora Von der Leyen a clamar pela necessidade, imperiosa, de se gastar muito dinheiro em armas e munições e António Costa talvez a dizer, com os seus botões, "onde eu me vim meter. Até pareço o Guterres!".

E, no meio disto tudo, recebi ontem (mais) uma carta da Unicef, a pedir-me nova ajuda para as crianças que, todos os dias, morrem de fome.  

domingo, 2 de março de 2025

Palavras bonitas ...

... para a minha mãe, que partiu há vinte e um anos e por aqui se mantém, diariamente, em recordações, sonhos, arrependimentos, certezas de que estive longe de ter sido um bom filho, lhe dei muitas e grandes preocupações e poucas alegrias.

A HORA DA PARTIDA

A hora da partida soa quando
Escurece o jardim e o vento passa,
Estala o chão e as portas batem, quando
A noite cada nó em si deslaça.

A hora da partida soa quando
As árvores parecem inspiradas
Como se tudo nelas germinasse.

Soa quando no fundo dos espelhos
Me é estranha e longínqua a minha face
E de mim se desprende a minha vida.

Poesia
Sophia de Mello Breyner Andreses
Caminho (2005)

sábado, 1 de março de 2025

Carnaval

É por estas ( e por muitas outras) que, mais de meio século depois da primeira vez, ainda faz sentido continuar a ler o Expresso.

Em papel, claro!

quarta-feira, 26 de fevereiro de 2025

Problema?!

Quem por cá anda há já bastante tempo, com um mínimo de atenção ao que o rodeia e com um pouco de memória, vai usufruindo de muitas coisas que já viu, já ouviu ou já leu noutras "eras".

Tem sido bem badalado nos últimos dias a ética ou a falta dela, o conflito de interesses, as "ajudinhas", os contratos de amigos e os amigos dos contratos, as cunhas e o compadrio sem que se vislumbre qualquer anormalidade e tudo sempre dentro da legalidade e com a máxima honestidade. Em síntese, acima de qualquer suspeita e clarinho como água ...

Há perto de sessenta anos, conheci um homem, na época já um velho empresário, que tinha sido motorista de um Ministério. Contava ele que, em determinada altura, o Botas proibiu os funcionários públicos de terem qualquer outra actividade.

- Ó senhor Ministro, logo agora que eu acabei de fazer a minha empresa, ainda por cima com dinheiro emprestado! Que vai ser de mim?

- Não te preocupes, António. A lei é só para os outros ... tu continuas aqui comigo, sem problemas.

sábado, 22 de fevereiro de 2025

História

No início da próxima semana, mais propriamente logo na segunda-feira, "comemoram-se" três anos da invasão da Ucrânia pela Rússia. 

Daqui a 80 anos talvez se consiga fazer a história do que motivou a barbárie, quantificar os muitos milhares que morreram e clarificar os interesses de alguns que destruíram a vida de muitos. 

Mau de mais para se encontrar um pingo de racionalidade, com a paz a ser, agora, determinada pelo alucinado da poupa amarela, em conjunto com o candidato a "czar" do século XXI. 

Valha-nos a subtileza de António, em mais um excelente cartoon, no Expresso desta semana. 

quinta-feira, 20 de fevereiro de 2025

Memórias

Ter no carro música de escolha aleatória proporciona momentos em que desaparecem quaisquer preocupações ou receios e só a memória funciona.

E sabe tão bem!

domingo, 16 de fevereiro de 2025

Passeios

De manhã, a chuva não permitiu ou, melhor, não aconselhou a caminhada domingueira para desentorpecer as pernas, necessidade imperiosa para quem tem tendência para a "doença do sofá".

À tarde, o Sol reapareceu, a areia estava convidativa e o passeio até à borda permitiu ver bem que o mar estava a mostrar a sua força, numa beleza que extasia sempre quem para ele gosta de olhar. O "fotógrafo da treta" registou os momentos de hoje. Amanhã será, como sempre, bem diferente.




sexta-feira, 14 de fevereiro de 2025

Casamento

O Dia dos Namorados parece ter sido motivador para o (re)entendimento entre Putin e Trump. Confirma-se o velho ditado (algo brejeiro) que "amor que pica, sempre fica".

Os dois vão alegremente partilhando interesses, recordando bons tempos por que passaram, analisando prendas possíveis e locais para a boda. Aguarda-se um casamento com elevada pompa e muita circunstância. Haverá um número restrito de convidados na mesa e muitos a ficarem à porta, em bicos de pés, esperando que algumas sobras caiam do céu ou, como antigamente era costume, apareçam algumas "línguas de gato" lançadas ao povaréu.

E, de novo, se cumpre mais um adágio: "quando o mar bate na rocha, quem se lixa é o mexilhão".

segunda-feira, 10 de fevereiro de 2025

Inteligência

E se, de repente, o Trump se lembrasse de comprar a Foz do Arelho para lá fazer um resort no qual a "boneca" se bronzeasse?

Parece estúpido e francamente improvável mas, nestes tempos, até o absurdo pode acontecer ...

sexta-feira, 7 de fevereiro de 2025

Palavras bonitas

Neste mar imenso
em que me vejo
de nada vale o que desejo
e o que penso.
Na vastidão do espaço
nem sequer um bocejo,
um débil ponto ou sumido traço.
No corpo voado que sonâmbula viagens
azul e mais azul trazendo
as miragens
de sonho já esquecido
e que me vão doendo
no corpo adormecido.
Neste mar imenso
de sal e água
lutando quase me convenço,
num misto de revolta e mágoa,
de que nada tem sentido.

Poemas num mar inquieto
Lino Sebastião
cordel d' prata (2024)

quarta-feira, 5 de fevereiro de 2025

Sempre perto ...

Lá longe, onde o Sol se levanta quatro horas mais cedo e o frio da rua deve enregelar a pontinha do nariz, acordou hoje o meu neto Miguel preparado para festejar o seu nono aniversário, na companhia do mano e dos pais e com todos, por aqui, a desejarem muitos anos de vida, tão perto quanto as novas tecnologias permitem.

Teve direito a dia de folga na escola e deve ter passado um dia bem divertido. A esta hora, a festa do dia aproxima-se do fim, com a hora da caminha a chegar muito em breve. Amanhã já não haverá folga e a escola voltar-lhe-á a pedir atenção, na forma sempre excelente com que ele encara a tarefa de conhecer e adquirir mundo.

Aproveita bem, meu neto. Um dia destes vou aí dar-te aquele abraço bem apertado, sem distâncias nem tecnologias a perturbarem o nosso contentamento.

Muitos parabéns, neto querido e ... até já!

terça-feira, 4 de fevereiro de 2025

Palavras bonitas

Partiu hoje uma das enormes, das quais já restam poucas.

A sua escrita há-de subsistir no tempo, lembrando outros tempos, negros, e buscando sempre um mundo novo, mais igual na diferença e, sobretudo, mais justo.

Maria Teresa Horta - 20.05.1937 / 04.02.2025

 

EXALTAÇÃO

Sou poeta, feiticeira
escrevo poesia

exaltada

pelo excesso da paixão
procuro a linguagem

Sou poetisa
Cassandra
conto histórias devastadas

invento verbos
e versos
ludibrio e reconstruo

vou em busca da gramática

Por entre temas e excessos
divido as orações
de freiras alumbradas

Sou poeta, pitonisa
moro na poesia

alada

não ganhei medo às fogueiras
apago-as com o regozijo
e o tumulto das palavras

Poesis
Maria Teresa Horta
D. Quixote (2017)

sexta-feira, 31 de janeiro de 2025

segunda-feira, 27 de janeiro de 2025

Auschwitz

Há 80 anos, as tropas soviéticas libertaram os poucos judeus que haviam resistido à barbárie hitleriana.

Vamos lembrando, pedindo para não ser esquecido, desejando que não se repita mas ...

domingo, 26 de janeiro de 2025

Mal(h)as que o império tece ...

Olha a mala, olha a mala,
Olha a malinha de mão,
Não é tua nem é minha
É de quem lhe deita a mão!!!







Aquele partido zangado e pregador, que se senta à direita de "Deus Ventura", perdeu um elemento de peso e já não tem meio cento. Agora são apenas quarenta e nove e o país vai sentir imenso essa diminuição. Por enquanto, vamos ter de conviver com esse descalabro, que talvez não fique por aqui.

E tudo isto porque, alegadamente, um ser inspirado e distraído desviou umas quantas malas das passadeiras dos aeroportos de Ponta Delgada e de Lisboa, nas múltiplas viagens de e para os Açores de que usufrui à conta do orçamento.

O homem não se explica claramente e com toda a razão. O processo está em segredo de justiça e isso rouba-lhe a memória, como toda a gente sabe. Para além disso, a presunção da inocência e o decorrer do tempo hão-de dar-lhe todas as hipóteses de lavar a honra, dispensando-lhe a inusitada tarefa de assumir o que fez. Nota-se claramente, na forma como o dito cujo explica o acontecido, que ele nunca roubou malas ... apenas umas quantas lhe acharam tanta graça que não resistiram em partilhar o seu conforto e ir com ele para a sua casinha ou, talvez até, para a sua caminha.

E continua a ser deputado da Nação, sem o mínimo de vergonha e com maior rendimento porque:

"Tem a consciência muito tranquila"

sábado, 25 de janeiro de 2025

"Trumpada"

Chapéus há muitos!

A clareza, a beleza, a actualidade e o "risco" do cartonista António, no Expresso desta semana.

sexta-feira, 24 de janeiro de 2025

24 Janeiro

Sem números, que a matemática não é o meu forte e eles, nesta altura, (já) não são importantes.

Apenas música ... da boa!

terça-feira, 21 de janeiro de 2025

Livros (lidos ou em vias disso)

"(...) Os tamarindos, além de servirem para compotas, também tinham uma vantagem particular para ele. Chupava os frutos e guardava as sementes castanho-pretas no bolso dos calções. Uma semente, quando esfregada durante meio minuto no chão cimentado de uma sala, aquecia bué. Ele se inclinava na carteira da escola para esfregar a semente no chão sem a professora ver e, quando estava bem quente, tocava com ela na perna da colega sentada à frente. Sucedia sempre um grito da menina, pois aquilo queimava mesmo. A professora nem precisava de perguntar quem tinha feito a maldade, o próprio Santiago levantava do assento com um resignado encolher de ombros e ia se ajoelhar num canto da sala, virado para a parede. O castigo era esse, ficava durante o resto da aula ajoelhado sem nada mais ver, só a parede. Doía mais o castigo do que a queimadura leve na perna da menina? Não se podem comparar as dores. Doíam. A menina, solidária e já esquecida da maldade, depois vinha lhe perguntar se os joelhos estavam muito mal e ele dizia, não é nada, vamos correr até no muro, te ganho de dez metros. Corriam, em competição feliz. Não fazia aquilo para lhe causar sofrimento, era uma brincadeira de criança, ela sabia perdoar. Se chamava Rita e tinha muito bom feitio, sorte de Santiago, como dizia a mãe dele, cansada de ouvir as queixas da Dona Esmeralda, mãe de Rita. Porque lhe fazes aquilo, não percebes magoa? Rita não queixava na mãe, a senhora é que notava as nódoas na perna da filha e a obrigava a confessar, quem te fez isto?, sabendo muito bem qual a resposta. Perguntada a razão do crime, Santiago respondia, não sei explicar, juro mesmo sangue de Cristo, o que exasperava os pais e demais familiares. Não sabes? E ainda por cima meteres Cristo no assunto? Apanhava castigo. Mas não podia evitar, uns dias depois reincidia.

Se tudo tivesse uma explicação, era tão fácil viver. (...)"

Tudo-está-ligado
Pepetela
D. Quixote (2024)

segunda-feira, 20 de janeiro de 2025

Casa Branca

Nem o frio, o vento ou a aba do chapéu da madam conseguiram desmanchar a poupa amarelada, bem penteada que, a partir de hoje, volta a mandar no mundo.

Será a laca usada de fabrico chinês? 

domingo, 19 de janeiro de 2025

Actualidade

A banda Cara de Espelho proporcionou ontem um excelente concerto a todos os que deixaram o quentinho do borralho e foram passar um bocado da noite ao CCC.

Espectáculo cheio de boa música, com letras críticas, algumas bem mordazes, todas cheias de actualidade.

Quem viu, viu e sentiu. Quem não foi, chuche no dedo e delicie-se com esta:

sexta-feira, 17 de janeiro de 2025

Palavras bonitas

À BELEZA

Não tens corpo, nem pátria, nem família,
Nem te curvas ao jugo dos tiranos.
Não tens preço na terra dos humanos,
Nem o tempo te rói.
És a essência dos anos,
O que vem e o que foi

És a carne dos deuses,
O sorriso das pedras
E a candura do instinto.
És aquele alimento
De quem, farto de pão, anda faminto.

És a graça da vida em toda a parte,
Ou em arte,
Ou em simples verdade.
És o cravo vermelho, 
Ou a moça no espelho,
Que depois de te ver se persuade.

És um verso perfeito
Que traz consigo a força do que diz.
És o jeito
Que tem, antes de mestre, o aprendiz.

És a beleza, enfim! És o teu nome!
Um milagre, uma luz, uma harmonia,
Uma linha sem traço ...
Mas sem corpo, sem pátria e sem família,
Tudo repousa em paz no teu regaço!

Odes
Miguel Torga
Gráfica de Coimbra 

Nota: Miguel Torga faleceu em Coimbra,  há exactamente 30 anos

quinta-feira, 16 de janeiro de 2025

Médio Oriente

O acordo estava na mesa há oito meses e, segundo Biden, não teve qualquer alteração. Nem uma vírgula.

A poupa do outro, que irá entrar em cena na próxima semana, veio dizer ao mundo, através das redes, que só tinha havido acordo graças à sua sapiente intervenção.

Ao contrário de ontem, as notícias de hoje já não são tão optimistas e parece que o governo de Israel não ratifica o que os seus representantes haviam combinado lá nas profundezas do petróleo, digo, do Catar.

A destruição continua; as mortes prosseguem; o ódio, recíproco, agiganta-se.

Até quando?

terça-feira, 14 de janeiro de 2025

E chato ...

Se eu não fosse uma pessoa discreta, descreveria o que vai pelo mundo como um cacharolete de interesses, egos, vaidades, poupas amarelas e lacadas, caras de pau destilando raiva, peneirentos em busca de lacaios, "sabões" que nunca passarão de "sabonetes" e dos bem pequeninos.

A discrição impede-me de fazer uma descrição exaustiva do que por aí vai, a começar nos atentados de guerra, passando pelos da gramática, pelos discursos a justificar o que não tem justificação, os perigos disto e daquilo, com erros ortográficos pelo meio e percepções resilientes que se atropelam continuamente.

Há muita gente à procura de protagonismo, poucos em busca do saber, muitos a necessitarem de "dez réis" de humildade, outros tantos a precisarem de educação e ainda, bastantes, a cuspir para o chão.

Ler, estudar, aprender, para quê?

Está tudo na Net e o que não está, compra-se!

segunda-feira, 13 de janeiro de 2025

Feiras

Estaremos todos preparados para o salsifré que está a acontecer na comunicação social?

Saberemos distinguir o que vale a pena ler, ver e ouvir, do que é lixo puro?

Apesar das grandes tiradas analíticas que enxameiam todos os canais, não estaremos a recuar aos tempos do "para cúmulo da chatice, tanto falou e nada disse"?

A informação parece uma feira onde uma grande parte dos responsáveis políticos e dos profissionais da dita vende cobertores e banha da cobra!

domingo, 12 de janeiro de 2025

Cuidados

Maré baixa, ondas medianas, muita espuma e muita areia, "aberta" a contrariar-se e a mostrar-se quase fechada e muito envergonhada, sem vento nem banhistas.

Das Berlengas, nem rasto: talvez escondidas, na procura de discrição e reserva, com receio de que Trump ainda se lembre de também as querer comprar. E se ...

quarta-feira, 8 de janeiro de 2025

Eça no Panteão

Era o tempo das Bibliotecas Itinerantes, serviço extraordinário com que a Fundação Gulbenkian levou livros a todos os recantos de Portugal. Já lá vão sessenta anos, ou mais.

Fui "cliente" da carrinha durante bastante tempo e, enquanto isso, foi de lá que trouxe a maior parte dos livros que li. O senhor da carrinha, motorista e bibliotecário, deve ter achado piada ao miúdo que, mensalmente, a ele se dirigia entregando os livros do mês anterior e levando mais dois ou três para o seguinte.

- Já leste tanto que hoje vou dar-te uma surpresa. Lês, não comentas e devolves no próximo mês.

Dobrou-se e, lá de baixo, retirou um livro com uma cinta vermelha. Juntou ao outro que tinha sido escolhido e entregou-me os dois. Não me lembro do que escolhi mas nunca mais me esqueci daquele que o senhor da carrinha elegeu, com um sorriso malandreco.

Devo ter lido "A Relíquia" em dois ou três dias e nunca mais esqueci o livro e a forma como a ele tive acesso. Quando pude, foi dos primeiros (terá sido o primeiro?) que comprei.

Hoje, os restos mortais de Eça de Queiroz foram trasladados para o Panteão Nacional, com a pompa que o grande escritor merece. Fica por lá a fazer companhia a grandes escritores - Sophia, Aquilino - e a outras personalidades portuguesas de relevo.

Por aqui, de vez em quando e sempre com deleite, passo os olhos por alguma das suas grandes obras. E concluo sempre: Eça escreve tão bem!

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"... Estava salvo! Rapidamente, ajoelhei à beira do caixote, cravei o formão na fenda da tampa, alcei o martelo em triunfo ...

- Teodorico! Filho! - berrou a titi, arrepiada, como se eu fosse martelar a carne viva do Senhor.

- Não há receio, titi! Aprendi em Jerusalém a manejar estas coisinhas de Deus! ...

Despregada a tábua fina, alvejou a camada de algodão. Ergui-a com terna reverência: e ante os olhos extáticos surgiu o sacratíssimo embrulho de papel pardo, com o seu nastrinho vermelho.

- Ai que perfume! Ai! ai, que eu morro! - suspirou a titi a esvair-se de gosto beato, com o branco do olho aparecendo por sobre o negro dos óculos.

Ergui-me, rubro de orgulho:

- É à minha querida titi, só a ela, que compete, pela sua muita virtude, desembrulhar o pacotinho! ...

Acordando do seu langor, trémula e pálida, mas com a gravidade de um pontífice, a titi tomou o embrulho, fez mesura aos santos, colocou-o sobre o altar; devotamente desatou o nó do nastro vermelho; depois, com o cuidado de quem teme magoar um corpo divino, foi desfazendo uma a uma as dobras do papel pardo ... Uma brancura de linho apareceu ...

A titi segurou-a nas pontas dos dedos, repuxou-a bruscamente - e sobre a ara, por entre os santos, em cima das camélias, aos pés da cruz - espalhou-se, com laços e rendas, a camisa de dormir da Mary!

A Relíquia
Eça de Queiroz
Livros do Brasil

terça-feira, 7 de janeiro de 2025

Premonição

Via-se Peniche lá ao fundo, logo a seguir ao Baleal; as Berlengas estavam no horizonte e mostravam bem a sua silhueta; o mar começava a encher e as ondas já indiciavam o tamanho XL; as nuvens faziam um esforço por esconder o sol. Vingativo, o astro-rei espreitava sem pedir licença e exibia-se aos poucos.

Perante este cenário, a conclusão é clara e simples: amanhã vai chover!

segunda-feira, 6 de janeiro de 2025

Arrumação

A casa, o escritório, os quartos, qualquer divisão, até a casa de banho, devem estar sempre bem arrumados, para não parecer que há desleixo e para ser fácil encontrar qualquer coisa de que se precise. Tudo tem o seu lugar e o hábito, a repetição, a lógica, facilitam a tarefa e dispensam a necessidade de pensar muito quando se precisa de algo. Desta vez, o que parece impossível aconteceu.

- Onde parará o livro?

Só pode estar aqui, ou ali, ou acolá! Perdido não está. Nem saiu de casa ...

Uma luta incessante, abaixo e acima, aqui e ali, talvez acolá. Tão estranho. Sem resultado! São horas de ir dormir e faz parte da rotina ler qualquer coisa.

- Bom, vou buscar o próximo. Sem ler é que não fico. Pode ser que apareça durante a noite ...

Estará no carro? Não! Caiu e está debaixo de algum móvel? Claro que não! Voltou ao seu lugar na "biblioteca"? Já verifiquei! Na cama não ficou nem no WC, último sítio de leitura, se a memória não atraiçoa. E o sono tardava.

- Parece bruxedo!

Não foi! Só "nabice"!

Era necessário consultar os passaportes e eles estavam na gaveta, cobertos por alguns outros documentos que saíram, para a remoção ser possível. O livro, que ainda estava na mão, foi colocado em cima do móvel e foi tapado pelos documentos retirados, sem sequer ter um queixume que avisasse o distraído.

A rotina e a preocupação em manter a arrumação recolocou os documentos no sítio e nem deu pelo peso e volume aumentados. O livro foi junto e por lá ficou, sossegadinho, tão bem acompanhado que não tugiu nem mugiu quando, depois de um sono em sítio tão desconhecido quanto recôndito, foi apanhado e voltou à sua obrigação: continuar a ser lido!