domingo, 20 de setembro de 2020

A transformação do café

O mundo, como sempre tem acontecido, está a transformar-se e os olhos, velhos, já têm alguma dificuldade em enxergar todos os pormenores dessa transformação.

Desde que me conheço enquanto "gente grande" que bebo café, nos cafés.

- Vamos beber uma bica?

E, ao final do dia, eram tantas que nem valia a pena fazer a contabilidade. Nos últimos anos, o medo e a conversa do "faz mal" produziram a redução para a meia dúzia diária, não mais. A entrada em "férias definitivas" reduziu o número para metade e dessas, normalmente, duas são caseiras que o "café é muito bom". A ida ao café depois do almoço mantém vivo o ritual de tantos anos mas, ou eu me engano muito, ou irá terminar em breve. As bicas eram, quase sempre, tomadas ao balcão, sem açúcar, em dois ou três goles, que o tempo não era coisa que abundasse. Raramente me sentava à mesa, não por qualquer preconceito mas por não me dar prazer nenhum. Sabia-me bem estar encostado ao balcão e ver o manípulo a ser cheio de café retirado do moinho, a chávena a sair do topo da máquina, quentinha, e, finalmente, o líquido a encher apenas até ao meio, como ainda hoje gosto.

O Corona alterou este ritual e obrigou-me a sentar na mesa, aguardando, se for caso disso, a vaga devida. E vou-me sentindo dinossauro ou peixe fora de água. Com a pandemia, o perfil da clientela vai-se alterando e o dono arrepiou caminho porque, se continuasse na senda de só a vender cafés, sandes e bolos, tinha os dias contados. A pouco e pouco, o "meu" café caminha para um moderno restaurante, com pratos rápidos e leves, saladas e massas, pizzas e hamburgueres. O cliente tradicional como eu vai rareando. 

Continuo a ser extremamente bem atendido e a sentir que querem continuar a ver-me por lá. Nunca preciso de pedir o café e até o Expresso me vem parar às mãos sem ser solicitado, mas ... cada vez são mais raros os clientes do café!

Sem comentários: