Era uma loja de ferragens no topo da Praça da Fruta, onde se vendia de tudo, da complicada ferramenta (para a época) ao simples parafuso, com e sem porca, de cabeça chata ou de tremoço.
O Sr. Galinha era um homem já bem entrado (hoje seria um idoso) e muito gago. A sua gaguez pode um dia destes também ter por aqui lugar, mas hoje não é disso que se trata.
A tasca do António Henriques, junto à Praça de Touros, tinha vários jogos de matraquilhos , num espaço situado ao fundo e aonde se chegava depois de atravessar a taberna e um pequeno quintal. Por isso, os três ou quatro "estádios" raramente tinham controlo arbitral do dono ou da dona, que tinha o nariz bem empinadinho. Marido e mulher ocupavam-se a servir os copos "de três" e a aviar as sandes de queijo ou de presunto, os pastelinhos de bacalhau e uns croquetes de carne, cujo cheiro se sentia à distância. Havia também carapaus fritos e secos, berbigões da Foz e ovos cozidos. Como facilmente se compreende, estes comes e bebes passavam-nos completamente ao lado.
O Sr. Galinha vendia 10 anilhas por 25 tostões e, coincidência, as anilhas eram exactamente do tamanho das moedas de 10 tostões, necessárias para abrir cada jogo de matraquilhos e obter as bolas que o permitiam concretizar.
Não será preciso grande esforço para se perceber o que acontecia: com 25 tostões obtinham-se "moedas" para efectuar 10 encontros e, por isso, antes de se entrar no António Henriques era obrigatório ir ao Galinha adquirir os "ingressos".
Para que tudo corresse pelo melhor e não houvesse suspeitas, colocava-se uma moeda, verdadeira, bem visível num dos topos da mesa, para que o "fiscal", se descesse ao campo, visse e não desconfiasse. A dona, tinha a certeza de ser enganada, dadas as surpresas que ia encontrando no "mealheiro", e aparecia por lá mal se conseguia libertar dos avios da tasca. Consequência imediata: a moeda verdadeira era utilizada para o último jogo do dia, ficando as anilhas sobrantes, se existissem, para o dia seguinte.
Nunca fomos apanhados em flagrante delito mas que os donos muito desconfiaram de nós, não tenho qualquer dúvida.
P.S. - No dia de hoje, Quinta-Feira da Espiga, não se jogavam matraquilhos.
1 comentário:
Ai, se fosse hoje. Ias parar ao psicólogo.
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