quinta-feira, 30 de setembro de 2021

Livros (lidos ou em vias disso)

Cinemas

Liz, Rex, Royal, Imperial! Que nomes de estadão. Ainda hoje impressionam. O giro dos meus cinemas. O Liz era o mais fino, aonde iam a mãe e a tia, muito bem-arranjadas, aos domingos. O pai não ligava a cinemas. Tinha visto Ladrões de Bicicletas em cópias privadas e colectividades esconsas, porque sim. O tio preferia o bilhar.

Havia classificações etárias, dos seis anos em diante. Quase todos os filmes (já censurados, cortados) eram para maiores de doze. O primeiro contacto que tive com o Shane foi a minha mãe a contá-lo, com entusiasmo. Anos mais tarde, eu confirmaria tal admiração. Mas, na altura, era preciso fazer batota, ou apanhar o porteiro da sala distraído.

Os colegas gabavam-se de terem truques, escapanços, cumplicidades que lhes deixavam ver filmes para dezoito anos! Dezoito anos! Ainda faltava tanto.

Mas chegou o liceu e, no liceu, no segundo ciclo, aquilo passou a ser um corrupio. A dois passos do Gil Vicente, ficava o belíssimo Royal que, por nossa causa, inconfessadamente, atrasava as sessões um quarto de hora, o que nos permitia assistir ao primeiro filme, logo desde o genérico, após correrias desenfreadas. Sessões duplas. Grandes coboiadas!

No Royal, a sala interior tinha um gosto requintado do princípio do século. Chão de pranchas. Muito baile ali rodou ... O Liz era discreto, fofo e elegante. No Rex, as cadeiras, de napa castanha, desagradáveis, adequavam-se ao filme negro do costume. O Imperial era modernaço, a atirar para francesices. Bem gravada (com obras-primas e tudo) me ficou toda a filmalhada que esqueci.

De maneira que é claro
Mário de Carvalho
Porto Editora (2021)

1 comentário:

Anónimo disse...

"Shane" um dos melhores filmes que vi quando também andei por esses cinemas. E pelo Gil Vicente.