sexta-feira, 24 de dezembro de 2021

Bom Natal!

Com a devida vénia e sem autorização do autor, transcrevo a crónica de Miguel Esteves Cardoso, publicada hoje no Público.

"Ao fazer as compras para o Natal, parei diante da garrafa do meu vinagre preferido e olhei para os outros vinagres, para aqueles que não estava a levar e, sobretudo, para aqueles que de bom grado levaria, caso não houvesse o vinagre que eu queria.

Havia dois ou três. Depois olhei para os azeites. E para os vinhos. E para os queijos. E para os pães. Estão muito melhores do que eram há 50 anos. E não são só um ou dois que é preciso perseguir - ou conhecer alguém ou pagar os olhos da cara.

Uma das desvantagens de se ser conservador é que se atrai uma catrefa de reaccionários, que querem companhia para cantar o fado do "antigamente é que era bom".

Mas o que é que era bom antigamente? A saúde? A educação? A liberdade? O prestígio de Portugal no mundo? A fome?

Não é só a escolha de vinhos. Mesmo os vinhos piores, se fossem comparados com os piores de antigamente, seriam bons. Os piores vinhos de agora podem não ter qualidades, mas, em contrapartida, quase não têm defeitos.

Nos vinhos e nos azeites, tal como nas casas de banho em geral, há uma limpeza e uma higiene que antes não havia. E essa higiene não é só uma questão de produtos químicos e de dinheiro: está cada vez mais nas atitudes de cada um.

É Natal. No meio dos discursos interesseiros da catástrofe e do mal-a-pior lembre-se de todas as coisas que melhoraram.

Até para os pobres. Até para os ricos.

É verdade que, sem queixas, ameaças e catastrofismos, nada melhora, nada teria melhorado. Mas bem que podíamos fazer um intervalo, quando deitamos o azeite sobre o bacalhau, puxamos de um bocado de pão e damos um golo de vinho.

Ainda falta muito? Claro que falta. Mas também não convém termos pressa para termos tudo.

O que interessa - e encoraja - é que já faltou mais.

Bom Natal!"

1 comentário:

Zé do tintol disse...

Desculpem ter-me fixado nas casas de banho. Agora já não são como no antigamente. Já não se escreve nas paredes. Aquela veia literária agora passou-se para os teclados. Não é a mesma coisa. Ai que saudades!!!