segunda-feira, 23 de maio de 2022

Sinas

Por muito mal que estejas, ali ao lado há sempre quem esteja pior.

Está por cá há vinte anos. Tinha chegado há pouco quando a conheci a procurar trabalho. Foi admitida na Associação que era (e é) a minha e por lá se mantém ainda. Nasceu na Ucrânia, tem o filho na guerra e dois netos e a nora refugiados na Polónia. 

Atingiu, recentemente, a idade da reforma. Foi à Segurança Social saber quanto lhe caberia e começou a fazer planos para o regresso ao convívio dos seus. A parca pensão que lhe informaram ir ser atribuída chegaria para viver lá com alguma dignidade. A guerra alterou todos os planos e trouxe sofrimento, muito, visível no acabrunhamento que mantém sempre. Para cúmulo, a carta que recebeu referia um valor de menos de metade do que lhe havia sido indicado. 

- Não percebe nada. Ajude mim, favor.

Tentei esclarecer e não foi fácil. Apesar dos anos, o vocabulário é curto e "provisória" era uma palavra desconhecida. A pensão é provisória até chegar um documento do seu país de origem, que permitirá o cálculo da pensão definitiva. Quando? Ninguém sabe.

Uma segunda carta informa que, daquele valor que é provisório, ainda lhe vão descontar, em seis prestações, uma verba que o Fundo de Desemprego lhe terá pago a mais. Ainda foi mais difícil de explicar. 

- Fui lá quando não pagaram ordenado. Passei fome. Comi pão duro com água muitos dias.

A Segurança Social só atende por marcação. Vou acompanhá-la lá, no início de Junho, sem grande esperança de conseguir solução. Se calhar, nem me deixam entrar!

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