quinta-feira, 17 de novembro de 2022

Vespas

Surgiu do nada, sendo que esse nada foi algo de palpável ou resultado de distração: porta aberta, janela entreaberta, qualquer objecto vindo de fora e ela aproveitou a boleia. Era a possibilidade de conhecer novos caminhos, novas paisagens, outros costumes.

Não há certeza sobre a forma como apareceu no vidro da janela, subindo e descendo de forma vagarosa, como a deliciar-se com o passeio mas buscando a liberdade que a luz do dia lhe indicava, apesar da chuva incessante. 

- Olha uma vespa! É enorme!

Era bem maior do que aquelas que aparecem normalmente no jardim e que por lá permanecem sem causarem qualquer dano, embora, por vezes, se devam arreliar com as primas abelhas, na disputa do pólen de melhor qualidade. A preocupação de evitar o seu desaparecimento da natureza condicionou a racionalidade do perigo que ela transportava, sentindo-se aprisionada e perturbada.

Abriu-se a janela, tentando que, sem chegar perto e sem movimentos bruscos que a assustassem, ela descobrisse, com o seu radar próprio, o caminho para o sítio de onde tinha vindo ou algum parecido. O semáforo não funcionou e a seta, virtual, que lhe foi apresentada foi ignorada por completo. A aflição começava a dar sinais.

- Vai buscar um pano, pega-lhe e manda-a pela janela.

Há muitos anos que não era picado por uma vespa. Lembrava-me bem da última vez e das dores que me tinha causado. A racionalidade não esteve presente e o pano não criou a protecção necessária. A vespa não perdoou a ousadia e ferrou o dedo com tal violência que o pano, com ela dentro, voou pelo quintal fora.

Não faço ideia se, como se diz, ela morreu depois de ferrar o "dente". Isso já não me preocupa, até porque o Código Penal, que eu saiba, ainda não prevê que possa constituir crime sacudir para longe uma simples vespa.

O que sei é que já passaram quase dois dias, já coloquei vinagre várias vezes, apertei com uma faca, coloquei gelo, besuntei com Fenistil e o "pai-de-todos", esse dedo fundamental para a linguagem gestual dos machos, ainda não me deu descanso, continuando a trazer a vespa à minha mente, sem contemplações e com dores suficientes para eu não a esquecer.

3 comentários:

Anónimo disse...

Imperioso ir ao médico. Por todos os motivos.

Anónimo disse...

Sugiro consulta a quem perceba do assunto.

Anónimo disse...

Não era uma "simples" vespa. Era uma vespa "maior". Que morreu embrulhada.