terça-feira, 17 de janeiro de 2023

Santo Antão

Ainda que S. Pedro não esteja a colaborar, mandando chuva, vento e frio em quantidade significativa, hoje deve haver Santo Antão naquele monte sobranceiro ao castelo de Óbidos, depois de dois anos de jejum pandémico.

A "festa do chouriço" fazia parte da alforria da (minha) juventude que, noutros tempos faltava às aulas e para lá caminhava em busca de alguma diversão, dos namoricos, do chouriço assado e, muitas vezes, da estreia na água-pé, bebida transportada pelos mais velhos nos garrafões empalhados e que eles facultavam a quem pedia e ofereciam a quem passava. Por vezes, havia algum tocador de concertina a animar a paródia e a pôr toda a gente a dançar, quando as pernas já estavam meio trôpegas e a cabeça algo toldada.

Ao final do dia, a juventude regressava a pé ou no comboio e a maioria dos mais velhos lá ia ficando a fazer o sacrifício de acabar com o chouriço, o pão, o vinho e a água-pé, para não regressarem carregados, por ser feio desperdiçar comida e muito menos bebida e, finalmente, por valer mais fazer mal do que sobrar.

Não tenho a mínima noção da forma como, actualmente, se faz a festa do santo do chouriço, lá bem no cume do monte, onde agora se chega subindo escadas ao invés de palmilhar aquela enorme inclinação à custa de escorregadelas e atabalhoados agarranços à primeira coisa que surgisse, fosse urze ou esteva, pinheirito ou cardo. O importante era evitar a queda.

Há muitos, muitos anos que lá não vou. O estômago passou a zangar-se com o chouriço assado e ganhou aversão ao vinho e à água-pé. Os joelhos já não dispõem da elasticidade necessária para subir tantos degraus, a curiosidade vai desaparecendo e a pachorra perdendo-se.

Enfim, alterações que a idade tece ...

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