sábado, 5 de dezembro de 2020

Depressão

Ontem fui surpreendido por uma SMS da Dora. Não me lembrava de ninguém com este nome, não constava dos meus contactos mas isso era irrelevante. Avisava-me que chegaria no final do dia e que ficaria até hoje. Confesso que não me lembrava de lhe ter feito qualquer convite mas, em confinamento, uma visita é sempre bem-vinda, embora com riscos. Pensei logo nos cuidados a ter: obrigá-la a descalçar-se à entrada, a usar a máscara, a ter distanciamento social, a lavar as mãos com sabão azul e branco, que é o mais eficaz, tudo isto para me salvaguardar, dada a minha condição de idoso de risco. 

Uma visita de vinte e quatro horas, na situação actual, era muita gentileza da parte dela e eu não tinha nada preparado. E agora? Se me tivesse avisado com maior antecedência, a recepção seria, por certo, mais adequada e gentil. Podia ter à sua espera uma graça, uma recordação da cidade, um bolinho, um bom vinho, uma fatia de presunto, uma ginjinha com chocolate, uns pistachos, amendoins ou pinhões, até talvez um caldinho verde, com uma rodela de chouriço.

Nada, não tinha nada.

Pensei: vou sair e compro qualquer coisa, mesmo pouco que seja. Fico bem visto e ela ficará satisfeita. Devemos obsequiar quem nos visita, é o mínimo. Reli a mensagem, para ver se havia tempo. Estava lá tudo, de forma imperativa: se não é urgente e fundamental, não saia, fique em casa sossegado.

Foi o que fiz. Acendi a lareira e sentei-me à espera. Veio a chuva, o vento assobiou, o granizo surgiu, a luz manteve-se, a noite caiu, o sono chegou. A Dora, felizmente, não apareceu.

Ainda bem! Receber visitas sem nada para lhes oferecer faz-me corar de vergonha!


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