quinta-feira, 5 de agosto de 2021

Figos

As felosas-brancas cirandam por toda a copa da figueira, saltando de ramo em ramo e comendo os maduros figos que por lá se vão dando. Passeiam-se pelos grossos troncos, ocupam as melhores folhas, saboreiam o melhor sol, resguardam-se na sombra divina quando o calor aperta.

Na parte de baixo, esvoaçam as fuinhas-dos-juncos, tentando subir o tronco sem nunca o conseguirem. Falta-lhes a força, e a capacidade de voar também é diminuta; sobra-lhes a fome e o medo de caírem da árvore. O controlo é apertado, as "donas" da figueira não admitem veleidades nem heroicidades, que o respeitinho é muito bonito e quem manda, gosta.

Mal nasce o Sol, as fuinhas ainda tentam aproveitar alguma distracção própria do acordar, e ensaiam subir, para alcançar um qualquer figo, mesmo que não dos de interior mais fofinho. Impossível. Há sempre alguma felosa bem acordada e vigilante que, com escarcéu e bater de asas, lhes retira qualquer entusiasmo e as obriga a contentarem-se com as pequenas migalhas largadas de cima.

E todos os dias se repete a cena de há milhões de anos: as felosas-brancas enchem o papinho e deliciam-se com o docinho dos figos bem madurinhos; as fuinhas-dos-juncos contentam-se com os restos, as sobras, os podres e os que, verdoengos, nunca chegarão a ter sabor.

O resto da passarada encara como normal que "enquanto uns comem os figos, a outros lhes rebentem os lábios",

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