quarta-feira, 3 de novembro de 2021

Notas

Havia a preocupação de separar todas as notas que se apresentassem deterioradas, escritas, borratadas, e de as retirar da circulação. Na maior parte das vezes os clientes nem se apercebiam desse trabalho, a não ser que o estado das mesmas fosse de tal maneira catastrófico que surgissem dúvidas sobre a sua valorização na totalidade pelo Banco de Portugal. Quando tal acontecia, a nota era contabilizada numa conta de transição e, posteriormente, o cliente seria ressarcido pelo montante atribuído pelo Banco de Portugal, normalmente valores entre os 50 e os 80 por cento, consoante a degradação.

Apareciam as situações mais díspares: rasgadas nas pontas, coladas com fita-cola, descoloridas pela acção das máquinas de lavar, cosidas com linha, com nódoas de óleo ou de azeite, com uma variedade imensa de frases, mensagens de amor, votos religiosos, preces e desejos.

Recordo, ainda hoje, uma quadra que deu brado, quando surgiu ao ser efectuada a recontagem de um maço de notas de 20 escudos. Tinha passado despercebida no recebimento do depósito, por a nota estar em excelente estado. A quadra estava escrita no branco da marca de água, com letra pequenina e bem desenhada. O poeta escreveu o seu desejo e pretendia que a nota servisse para o proclamar aos sete ventos:

" Vai-te, nota ingrata,
Por esse mundo sem fim ...
E diz às notas de mil
Que não se esqueçam de mim! 

A nota não cumpriu a missão, mas o verso ficou bem guardado na memória.

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