sábado, 23 de julho de 2022

Actualização

Numa época em que o vocabulário é cada vez mais escasso e repetitivo, fica-se espantado quando se lê, algures, que Camões utilizou mais de nove mil palavras diferentes n'Os Lusíadas. Talvez Aquilino Ribeiro, Miguel Torga, José Saramago ou António Lobo Antunes tenham batido aquele número no conjunto da obra de cada um mas, num livro apenas, tenho dúvidas. Quando tiver tempo livre ou sem tarefa  distribuída, vou contar ...

Acresce que, na época, os pronomes utilizados para designar plural não revelavam as preocupações que hoje abundam e a necessidade imperiosa de referir claramente que elas e eles foram à festa num carro que não era seu e sim do seu pai e da sua mãe, que o haviam cedido à filha e ao filho para esta e este se deslocarem, com as amigas e os amigos, ao festival de verão onde iriam actuar as artistas e os artistas mais em voga nesta altura. Ela e ele tinham adquirido os bilhetes e as amigas e os amigos haviam comprado a tenda onde todas e todos dormiriam após uma noite em que elas e eles se divertiriam o suficiente para que esta saída ficasse bem marcada na memória de todas e de todos.

Se Camões vivesse hoje, Os Lusíadas teriam, estou convicto, mais palavras diferenciadas e versos bem mais adequados ao rigor que a ditadura da língua passou a determinar, com ou sem o malfadado Acordo. Corrigiria o verso "... e aqueles que por obras valerosas / se vão da lei da morte libertando ...", para o correspondente ao que hoje é considerado correcto, o que daria: e aquelas e aqueles que por obras valerosas ... se vão espantando com as novas necessidades do dia a dia.

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